quarta-feira, 30 de outubro de 2013


 

TÉCNICAS DA GRATIDÃO

A gratidão pode ser considerada como uma condição para ser feliz, conforme a definiu Albert Schwetzer, informando que ela era o segredo da vida.
Ele, mas do que qualquer outra pessoa, sempre bendizia a vida, apesar daqueles dias nem sempre confortáveis em Lambaréné, na África Equatorial Francesa, onde mantinha a sua obra de dignificação humana.
Europeu da cidade de Kaysersberg, na Alsácia, ao transferir-se com a esposa para aquela região hostil, experimentou o áspero clima tropical, a elevada humidade do ar, na floresta densa, as condições quase inóspita para alguém que sempre vivera em região fria e civilizada, a falta de recursos para qualquer tipo de comodidade, e, apesar de tudo, manteve o sentimento de gratidão viva em sua existência, cantando louvores a Deus.
Foi ali, em condições desafiadoras que ele escreveu duas obras monumentais: A busca do Jesus histórico e um tratado de ética dos mais belos do século XX.
A sua ética estava expressa no conceito: respeito pela vida, que ele defendia com sacrifícios até o máximo possível.
Uma análise das bênçãos que a existência física proporciona seria suficiente para se agradecer por se estar vivo no corpo; pelo ar que se respira; a água, o pão que a natureza fornece, ao lado das maravilhas de que se veste o cosmo; as noites estreladas, a poderosa força mantenedora do Sol e a tranquilidade magnética da lua, a brisa refrescante, a chuva generosa, a temperatura agradável... tudo que vibra e que merece gratidão.
É certo que existem os desastres sísmicos, as tormentas de vário porte, que também são dignos de reconhecimento,  facultando a valorização do que é saudável e dignificante.
Fossem apenas agradáveis todos os fenômenos existenciais e não haveria mecanismo válido para se promover o progresso moral do ser assim como o desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade.
Envolto no escafandro material, o self é candidato à superação das circunstancias, trabalhando-se com afinco para alcançar a plenitude da sua função indestrutiva.
Inspirando o ego a modificar a estrutura do comportamento, faculta-lhe, ao largo do tempo, a visão inspiradora do desenvolvimento interno, diluindo a sombra que também se lhe torna motivação para a conquista de novas experiências, proporcionando-se bem-estar, que é essencial para uma existência compensadora.
A busca dessa sensação de alegria e de satisfação transforma-se num motivo estimulante ao ego, mesmo que relutante, porque a ausência desses pequenos prazeres aumenta o sentimento de culpa, frustra a autorrealização, empurra para transtornos complexos e mórbidos, que se transformam em enfermidades orgânicas por somatização.
É nesse embate que surge a necessidade da gratidão, não apenas em relação ao que se recebe, mas, sobretudo pelo que é possível oferecer-se, participando do espetáculo da vida em sociedade na condição de membro atuante e não de parasita prejudicial.
Sempre há quem justifique não possuir muito para repartir, olvidando-se que a maior doação é aquela que nasce na grandeza do pouco, qual a referência evangélica em torno da oferenda da viúva pobre. Mesmo ela possuía algo para doar ao templo, cumprindo a lei que assim o estatuía.
Dádivas outras, não menos valiosas, consistiam na oferta do trabalho de limpeza do santuário, dos lugares em que os outros pisavam, na conservação dos objetos do culto, nos cuidados reservados a tudo que dizia respeito ao templo, em razão de não possuírem sequer a liberdade ou porque rastejassem nas situações humilhantes do serviço detestado pelos vãos e orgulhosos sacerdotes, ricos de presunção e pobres de sentimentos...
A gratidão pode também se expressar de forma especial, como sendo respeito e apreço, consideração e amizade, singelos padrões de comportamento social que devem existir em todo grupo humano.
O hábito de retribuir dádivas restringiu o sentimento gratulatório, tirando-lhe a beleza emocional. Claro está que dividir o que se tem com quem também oferece representa um passo avançado na psicologia da gratidão. Entretanto, merece que seja considerada a oferta que nasce do coração, sem nenhuma outra motivação material que seja retribuição, transformando-se em oferta da gentileza, da alegria de viver, porque se faz parte da orquestra viva da sociedade.
Esses gestos espontâneos contribuem para a felicidade que se aspira, gerando situações positivas na existência, por modificarem os sentimentos do gentil doador, que se aureola de harmonia, porquanto o doar é sempre acompanhado pela imensa satisfação de assim proceder.
Todo aquele que aspira alcançar o planalto da saúde e da harmonia é convidado a exercitar-se na arte de oferecer e de oferecer-se.
 Em Atos dos apóstolos, dentre muitos outros há um momento encantador, quando Pedro e João saem do Templo de Jerusalém e os pobres, os enfermos, os aflitos distendem-lhes as mãos, suplicando auxilio monetário, especialmente um coxo que aguardava a esmola em forma de moeda.
Percebendo-se destituído desses recursos, Pedro, com ênfase, olhando João, disse ao sofredor: “Não tenho prata nem ouro, mas o que tenho isso te dou: em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, anda!” (At 3:6)
Ante o assombro geral, o enfermo recuperou os movimentos, deslindou os membros paralisados e ergue-se jubilosamente...
A partir daí, dessa dádiva de amor, as pessoas colocavam os seus pacientes por onde os dois passavam, a fim de que “a sua sombra cobrisse alguns deles” (At 5:15), na expectativa de que os curasse.
Todas as coisas são boas e merecem respeito, no entanto aquelas que são conseguidas como dádivas do sentimento, que não são compradas, possuem um valor emocional muito maior.
Desse modo, ninguém se pode escusar de oferecer algo de si mesmo, contribuindo para o bem-estar geral, que começa no ato da oferta.
É sempre melhor doar do que receber, porquanto aquele que doa é possuidor, ocorrendo com quem recebe a situação de devedor, e uma das maiores dívidas que existem é a da gratidão, porque um socorro em momento especial define todo rumo da existência, que passa a dignificar-se, a crescer, a produzir, após esse instante significativo.
Quando se mata a fome ou a sede, oferece-se segurança e trabalho a quem os necessita, doa-se paz e alegria de viver àquele que se encontra à borda do desespero suicida, tudo quanto lhe vem a suceder é fruto daquele gesto salvador.
A dívida, pois, ao que recebeu não pode ser resgatada senão por outra vida.
Narra-se que um indiano, que tivera o filho assassinado por um paquistanês, nos hórridos dias da guerra entre as duas nações, buscou o Mahatma Gandhi e contou-lhe a tragédia que se permitiu, rogando-lhe ajuda, orientação.
O sábio mestre meditou e respondeu:
- A única maneira de resgatar o seu crime é educar uma criança órfã paquistanesa como se fora seu filho.
O interrogante argumentou:
- Mas somos inimigos e um deles matou o meu filho.
Tranquilo, redarguiu o mestre:
- Tornamo-nos inimigos uns dos outros porque isso nos compraz. Somente porque o alucinado matou o seu filho, você não tem nenhum direito de retribuir-lhe o crime, tornando-se igualmente homicida.
O homem, sensibilizado, adotou uma criança paquistanesa e dela fez um cidadão de bem.
Final do texto, porém o cap. 10,  TÉCINICAS DA GRATIDÃO, escrita por Divaldo Franco Espírito Joanna de Ângelis, no livro PSICOLOGIA DA GRATIDÃO, continuará na próxima postagem.

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