A coragem de prosseguir em qualquer
circunstância (continuação)
Cap.
5 do livro, EM BUSCA DA VERDADE
Divaldo Franco/Joanna
de Angelis
A
individuação não é uma conquista fácil, tranquila, mas resultante de esforços
contínuos, devendo passar, às vezes, por fazes de sacrifícios e de renuncias.
Ninguém consegue uma vida de bem- estar sem o imposto exigido em forma de
contínuas doações de dor e de coragem, enfrentando todas as situações com
estoicismo, sem queixas, porque, à semelhança de quem galga uma elevação, à medida
que se esforça para conseguí-lo, beneficia-se do ar puro, do melhor oxigênio.
A
individuação é o oxigênio puro de
manutenção do ser.
A
conquista desse estado numinoso pode
ser comparada a uma forma nova de religiosidade, na qual se consegue a harmonia
entre a vida na Terra e no céu.
Anteriormente,
por não existir a psicologia analítica, a religião albergava todas as
necessidades humanas e a confissão auricular produzia um efeito psicoterápico na
liberação da culpa, mantendo, no entanto, irresponsável o indivíduo, que achava
muito fácil errar e ser perdoado, ferir e ser desculpado, sem realizar o
processo de autoiluminação.
Graças,
porém, à visão nova de Jung, os mitos religiosos podem ser substituídos pelos arquétipos
e os conflitos, ao invés de recalcados e desculpados, devem merecer catarse,
diluição, enfrentamento e reparação dos danos que hajam causado.
São
os arquivos do inconsciente que conduzem o indivíduo e não o seu ego sujeito às alternativas dos
interesses imediatos.
Nesse
arquivo grandioso do Espírito, o ego
pode e deve manter diálogos com o Self
para tomar conhecimento lúcido dos seus conteúdos e melhor conduzir os
equipamentos de que dispõe na sua proposta de vida.
É
identificando o erro que se aprende a melhor maneira de não o repetir. O que
denominamos como erro, no entanto, trata-se de uma experiência incorreta,
aquela que ensina a como não mais proceder dentro dos seus parâmetros,
terminando por ser valiosa contribuição à evolução.
O
ser humano, portanto, é algo maior do que as expressões exteriores, os êxitos momentâneos,
constituindo-se de toda a sua história que registra insucessos e vitórias,
tristezas e alegrias, produzindo-lhe o equilíbrio que o segura e mantem no rumo
certo.
O
pastor que resgata a ovelha perdida, torna-se mais vigilante em
relação à mesma, assim como às demais, evitando-se excesso de confiança,
porque, à medida que o rebanho avança, existem desvios e abismos perigosos...
Ante
a ovelha que foge, a atitude do pastor é o socorro maternal, nada
obstante, às vezes, o animal rebelde liberta-se dos braços protetores e
novamente desaparece, optando pelo desvão no qual se oculta... Em tal situação,
em seu benefício, o pegureiro assume o seu animus
e, vigoroso, aplica-lhe o cajado ou atiça-lhe o cão, encaminhando-o de volta ao
aprisco.
É,
portanto, inadiável o dever de prosseguir-se no compromisso relevante sob
qualquer custo, seja qual for a circunstância em que se apresente.
A
insistência de que se dá provas, quando se optando pela situação doentia, pelas
sinuosidades de comportamento sem responsabilidade, propele a consciência – o pastor vigilante – a impor sofrimentos
que se encarregam de apontar o rumo correto, de encontrar-se o que se está extraviando ou foi deixado na
retaguarda...
O
ocidental acostumou-se com os limites da emoção e adaptou-se aos prazeres da
sensação de tal modo, que tudo aquilo que o convida à inversão desse
comportamento parece-lhe de difícil aplicação e, por tal razão, evita viver a
proposta de olhar para si mesmo, para dentro, de autopenetrar-se para descobrir
os incomparáveis tesouros da alegria íntima, da vivência elevada, sem cansaço,
sem ansiedades nem expectativas. Esse esforço é realizado somente quando não
tem outra alternativa e quando apresenta cansaço em torno do conhecido gozo dos
sentidos.
É
necessário passar por todas essas experiências, experimentar dificuldades e
acertos, sofrer perseguições e ser eleito, porque tudo isso faz parte da
constituição arquetípica da evolução, e ninguém pode vivenciar um estagio sem
passar pelo outro.
Essas
necessárias capacitações desenvolvem os sentimentos, aprimoram a visão em torno
da vida, amadurecem o ser psicologicamente, trabalhando-lhe o Self, a fim de que os seus valores
profundos abram-se em benefício da individuação.
Normalmente
as criaturas queixam-se das cruzes que carregam e as fazem sofrer,
parecendo-lhes injusto ter que as conduzir com dificuldades, vivendo em
situações difíceis e ásperas. De alguma forma, o conceito e peso da cruz estão
muito vinculados ao complexo da infância que
se encarregou de dar a visão do mundo. De acordo com a educação recebida a
criança passa a ter conceitos da existência que são herdados dos pais. Por essa
razão, para alguns, o que constitui fardo, para outros é aprendizado valioso.
A
pessoa deve aprender desde cedo a enfrentar os fenômenos existenciais como
parte do seu programa evolutivo, o que equivale significar que, se dando conta
da própria sombra não a deve
transferir para outrem, mas cuidar de diluí-la, mediante a compreensão das ocorrências.
A sombra tem uma vestidura moral em
contínuo confronto com a personalidade-ego,
exigindo, por isso mesmo, o grande esforço de igual magnitude moral, para
conscientizar-se, compreendendo e aceitando os fenômenos perturbadores que lhe
ocorrem como inevitáveis.
A
maioria, no entanto, não a aceita como inerente, elemento constitutivo de todos
os seres, portanto, presente em todas as vidas.
Rejeitar
ou ignorar a sombra é candidatar-se a
conflitos contínuos que poderiam ser evitados, caso reconhecesse a ocorrência desse
fenômeno próprio do ser humano. Ela faz parte do ser, de igual forma como o ego, o Self e todos os demais arquétipos, que são as heranças do
largo trânsito da evolução.
Na
história mítica da Criação, quando Adão comeu o fruto que lhe foi oferecido por
Eva, teve que enfrentar a realidade da sua e da nudez em que ela se encontrava,
reagindo automaticamente, procurando um arbusto para esconder-se, quando lhe
surgiu o discernimento do ético, do bem e do mal, da malícia e do desejo,
resultando nessa fissão da psique, o anjo
e o demônio, cuja harmonia deve
ser conseguida através do enfrentamento de ambos, num processo psicoterapêutico
de consciência lúcida.
De
igual maneira, a sombra que dali
procedeu permanece no complexo psicológico do ser exercendo o seu papel como
herança ancestral do conflito inicial.
A
inocência bíblica das duas personagens é referencial mítico para ocultar as
funções edificantes da sexualidade, que a castração religiosa considerou como
manifestação da inferioridade e de tormento.
À
semelhança de outro órgão, o sexo tem as suas exigências que devem ser
atendidas com a dignidade e o respeito que lhe são pertinentes. Quando o
indivíduo se permitiu a corrupção de qualquer natureza, ei-la refletindo-se também
no comportamento sexual, que se torna válvula de escape para a fuga da
responsabilidade moral.
Desse
modo, os desafios da sombra merecem
observação carinhosa a fim de conseguir-se a sua integração no Self, não mais separando indivíduo do ser divino que ele carrega no íntimo.
Final
do título A coragem de prosseguir em
qualquer circunstância.
Postado
dia 08/10/2013.
Nenhum comentário:
Postar um comentário