GRAVITANDO EM TORNO DE DEUS
O
SER HUMANO PERANTE A SUA CONSCIENCIAOs arquétipos ego e self surgiram logo depois da fissão da psique, e junto com os sinais de consciência surgiram também sinais de despertamento das emoções várias e significado psicológico.
As primeiras manifestações de medo e da ira se fizeram seguir de outras expressões dos sentimentos adormecidos, propondo a continuação dos instintos de conservação e de reprodução da vida orgânica, possibilitando superação dos agressivo-defensivos, ou dando uma direção mais eficaz, assim escolhendo os que trazem prazer e harmonia e não os de sofrimento e desequilíbrio.
A dor brutal do princípio permitiu manifestações menos grosseiras, culminando nos fenômenos morais afligentes que o conhecimento tem o dever de suavizar, à medida que a consciência conquista os níveis superiores a que está destinada.
No Oriente, o discernimento que proporcionou o surgimento da consciência é encontrado na tradição do Bagavad Gita, parte do Mahabarata, quando o mestre Krishna, dialogando com o discípulo Ardjuna, o ajudou a penetrar na vida mística, especialmente na luta que deveria travar com destemor entre as virtudes (de pequeno numero) e os vícios (bem mais numerosos), com a aplicação das forças nobres da consciência.
No judaísmo surgiram os vislumbres do bem e do mal, nos livros mais antigos dos profetas, especialmente em alguns que foram considerados heréticos a partir do Concílio de Nicéia, no ano 325 d.C., convocado imperador Constantino. Entre esses destacamos o Livro de Enoque, em cujas lições Jesus teria encontrado apoio para o seu ministério, e os apóstolos João, Tiago, Lucas, nos Atos, e Paulo se inspiraria para a elaboração de importantes páginas que aplicaram nas suas propostas evangélicas e epistolares...
A dualidade arquetípica da sombra e da luz apresenta-se como Satã e Cristo, o Ungido, que vem das tradições orais, detestado o primeiro pela sua perversão e maldade – o outro lado da psique, o lado que se procura ignorar -, e o Cristo – a luz da verdade, do bem, da plenitude...
De maneira equivalente expressou-se o pensamento socrático-platônico no ocidente, apresentando a virtude como consequência dos valores morais ante os vícios de todo porte que degradam, impedindo o desenvolvimento do logos interno presente em todos os seres humanos...
Nas reencarnações, o Espírito aprimora os valores ético-morais e intelectuais, que desenvolve as faculdades da beleza, da estética, da arte em diversas manifestações que possibilitam superar os impulsos do primarismo pela espontânea escolha dos sentimentos morais elevados.
Vivenciando, em cada reencarnação, uma ou várias faculdades éticas, as suas variantes enriquecidas do bem sobrepõem-se à anteriores tendências, fixando os valores espirituais que culminarão na plenitude do ser.
Esses períodos, alguns marcados por grandes turbulências emocionais, despertam a consciência do ego para o conhecimento do si-mesmo, permitindo-lhe compreender a finalidade da existência carnal.
À medida que supera os episódios vivenciados no pavor, dando lugar as manifestações da afetividade, a princípio em forma de posse e domínio, e depois em atitudes de renuncia pelo bem-estar do outro, a ampliação da consciência objetiva impulsiona o Espírito para as conquistas de natureza cósmica.
Nesse momento, surge o nobre sentimento da gratidão com as suas mais simples expressões de alegria pelo que se recebe da vida, e mais adiante pela necessidade de retribuir, libertando-se da posse enfermiça e da paixão desequilibrante, antes orquestradas pelo ego e pelo arquétipo sombra.
Sentindo essa doce emoção de agradecer, ele é impulsionado para a cooperação edificante no grupo social para melhor e mais feliz, no qual a saúde real independe dos processos de desgastes pelas enfermidades ou pela senectude.
A consciência grata é risonha e saudável, e predomina em qualquer idade somática do ser humano.
Existem crianças e jovens com exuberância de saúde física, mas frios dos sentimentos de afeto, ingratos, mudando de atitude somente quando se encontram em jogo os seus interesses imediatos de significado egotista. Também destacamos valores de enriquecimento de gratidão em anciãos e enfermos que, mesmo passando por circunstancias e ocorrências orgânicas, tornam-se exemplo vivos de alegria, de luminosidade, de bem-viver ...Nem a aproximação da morte biológica os aflige ou atemoriza, mas sim alegra-os em agradável anuncio de libertação lhes tornando possível a individuação antes ou após a morte...
O sentimento de gratidão, portanto, não se deve apresentar apenas quando tudo é satisfatório, quando os fenômenos psicossociais, emocionais e orgânicos encontram-se em clima de satisfação de alegria, mas também nas adversidades. Reagir-se de maneira grata aos sucessos é normal e natural, e se assim não se procede é porque se é arrogante, soberbo, vivendo em conflitos desgastantes. O desafio à gratidão ocorre nos tempos difíceis, quando surgem as adversidades que também fazem parte do processo desafiador da evolução, já que nem sempre os céus humanos estarão adornados de astros, sendo todos chamados a atravessar a noite escura da alma com a luz do sentimento reconhecido a Deus pela oportunidade de experienciar novas maneiras de viver.
Normalmente, o sofrimento mata a gratidão e o indivíduo foge para a lamentação, para a autoacusação ou autojustificação, e faz uma comparação com as pessoas que parecem felizes e sem inquietação.
Sem as experiências dolorosas, ninguém pode avaliar as benignas por faltar parâmetros de avaliação. É preciso nesses momentos mais difíceis liberar-se da raiva, da mágoa, evitando a ingratidão pelos bens armazenados e pelas horas felizes vividas antes, continuando dessa forma a amar a vida mesmo nessas circunstancias que são indispensáveis.
O mito de Jó deve ser modelo de aprendizado, pela coragem e gratidão a Deus mesmo quando tudo lhe havia sido tirado: rebanhos, servos e escravos, filhos e recursos financeiros, ficando em estado lamentável, mas sem revolta.
A lenda diz que aquilo foi resultado da interferência de Satanás, que lhe invejando a felicidade e o amor a Deus propôs ao Criador que ele se mostraria igual as outras criaturas, rebelde, ingrato e desnorteado.
Aceitando o desafio proposto, o Senhor da Vida testou o afeto de Jó, cobrindo-o de chagas e de miséria, que reagiu de forma oposta à sombra, sendo fiel em todos os momentos e grato pelas provações, apesar da revolta da sua mulher...
Ele apenas perguntou:
- Por que eu?
E depois de muitas reflexões felizes concluiu que não existe bem sem mal, felicidade sem sofrimento, colocando Deus – o arquétipo primordial – acima de tudo e aceitando-Lhe as imposições sem revolta.
Em consequência, Deus mostrou a Satanás que Jó tinha sido fiel no teste e devolveu a ele tudo que lhe havia tirado...
Dilatando-se a consciência empobrecida pela lucidez, os arquivos do self (ser Espiritual, ser imortal, eu verdadeiro) liberam os arquétipos celestes, que procedem do primordial (que é Deus), e a gratidão também se torna o estado numinoso que proporciona a conquista cósmica recomendada por Jesus como a instalação do reino dos céus nos corações.
Texto de Joanna de Ângelis, psicografado por Divaldo Pereira Franco no livro, Psicologia da gratidão. Trabalhado e editado por Adáuria Azevedo Farias. 22/03/2019.