GRAVITANDO EM TORNO DE DEUS
Psicologia da Gratidão
SENTIMENTOS DE MÁGOA E DE DESENCANTO
Há, no ser humano, um sentimento perverso e de autodestruição levando-o
a guardar mágoas e desencantos,
como se fossem importantes para o seu desenvolvimento.
Essa é uma conduta masoquista, na
qual o indivíduo se transfere psicologicamente da alegria de ser para a
satisfação de sofrer, tornando-se vítima. Não conseguindo, por fragilidade
de valores morais, superar as situações mais difíceis, acomoda-se como
sofredor, querendo sempre despertar compaixão, quando deveria lutar para
despertar o amor.
Numa vida longa percebe-se que as mágoas
e os desencantos, por serem muito comentados, parecem mais numerosos do que os
momentos de risos, de felicidade, de harmonia, de aspirações belas e
generosas...
Se vê muitas vezes que as pessoas
preferem a chancela de não amadas à condição de pessoas amorosas.
Lamenta-se uma criatura de nunca ter
sido feliz, mas casou-se, tornou-se mãe... Se lhe disser que foi amada, talvez
antes do casamento, e que também amou, mesmo depois, quando começaram as
dificuldades, escapa logo para a bengala
psicológica, perguntando:
- Mas de que serviu, se logo depois
vieram as decepções e chegaram as mágoas?
Argumentando que só a felicidade de
haver sido mãe, até mesmo sob o ponto de vista fisiológico, enriqueceu-na de
momentos de alegria e prazer, corre logo para o falso mecanismo defensivo:
-Deus sabe quanto são ingratos e
indiferentes esses ditos filhos...
Nessa conduta doentia, somente foram anotadas as angustias e
frustrações, talvez proporcionadas por ela mesma. Assim, o sentido existencial foi transformado
em contínuo sofrimento, por causa da predomínio do ego em todos os fenômenos da jornada.
O sofrimento é fundamental em todas as
vidas, ninguém está isento de sua
presença, por causa da transitoriedade da organização fisiológica.
O sofrimento, porém, poderá ser examinado sob dois pontos de vista: pelo ego marcado por complexos inferiores e pelo self idealista. Pelo ego marcado por
complexos inferiores só anotará desencanto e dor, porque os valoriza, sem a
consciência de que esse fenômeno é normal e está presente na estrutura orgânica
de todas as formas vivas. O segundo, marcado pelo self idealista procurará
extrair os melhores efeitos da reflexão durante a sua vigência, o significado
moral, os recursos aplicados para superá-lo ou sofrê-lo sem a auréola do martírio,
da projeção do ego renitente ou doentio.
Não é necessária uma condição religiosa
para esse comportamento, porque é também logoterapeutica, por trazer sentido
existencial ao ser humano.
Muitas propostas filosóficas e psicológicas encontram-se
enraizadas nos princípios religiosos mais antigos, que exerceram o papel dessas doutrinas antes que
elas fossem formuladas. Com o crescimento intelectual e tecnológico se foram
desdobrando, como ocorreu, com a psiquiatria que se ampliou na psicologia e que
se multiplicou em diversas escolas do comportamento, de terapia, de
estruturação da psique e da personalidade.
Por isso, enganam-se aqueles que acreditam
ser a psicologia uma doutrina nova, resultado de elaboração recente, porque os seus postulados modernos estão
embasados nas religiões da Antiguidade como
também nos postulados da filosofia e das crenças populares de todos os tempos.
O ser humano é o enigma de si mesmo e,
para melhor entende-lo, sempre houve interesse de conseguir-se a sua interpretação.
As primeiras tentativas foram feitas pelos filósofos que se
depararam com o fenômeno da morte e
passaram a tentar compreendê-lo, para melhor decifrar os conflitos e os temores
que se lhes instalavam.
Por outro lado, os chamados mortos sempre se preocuparam por
desmistificar a ocorrência apavorante, demonstrando
a continuidade da vida em outras condições vibratórias. Graças a esse
interesse, sugiram as primeiras comunicações entre encarnados e desencarnados,
que não percebiam a magnitude dos eventos que se lhe aconteciam na intimidade
das furnas primitivas onde se refugiavam os perigos... o temor foi a primeira
reação emocional ante o inusitado. Para expulsar esses inesperados visitantes,
que os assustavam, imaginaram as práticas exorcistas, através de tudo
quanto a sua imaginação e sensibilidade acreditavam possuir poder mágico de os
libertar daqueles que desaparecidos pela
morte e, mesmo assim, voltavam. Nasceram, então, nessa fase, os cultos
religiosos, alguns temíveis, consentâneos com o estágio antropológico em que estagiavam,
sutilizando-se com o tempo até o momento em que foi possível a concepção dos
recursos imateriais, de alto significado emocional, como a oração, a prática do
bem, o sentimento de fraternidade aplicado em relação a todos, a ação nobre da
caridade...
Apesar dessa formosa conquista psicológica,
os atavismos perturbadores sempre vem a tona no processo da evolução, sendo
necessário que os compreendam e os combatam, com o esforço da autoconfiança, da
autorresponsabilidade, da autoiluminação.
A mágoa corrói os mecanismos eletrônicos
do cérebro que passa a sofrer-lhe as ondas de energia destrutiva, dando lugar a
conexões distônicas no conjunto das reflexões e do comportamento, influenciando
os sistemas nervosos simpático e parassimpático, ao lado de outros distúrbios. O
ressentimento, portanto, é ferrugem
nas engrenagens da alma, que sempre necessitam do lubrificante da
confiança e da alegria de viver, facultando bem-estar e alegria pessoal.
Todo indivíduo batalhador, atento ao cumprimento
dos deveres, com o tempo mental repleto de ideias edificantes e de preocupações
positivas, dispõe de uma grande quantidade de recursos para os enfrentamentos e
as incompreensões que defronta pelo caminho. Ninguém transita na Terra por
caminhos sempre florido e, mesmo quando existem muitas rosas, há também inúmeros
espinhos com a finalidade especial de protege-las.
Desejar-se uma existência física sempre risonha e fácil é
imaturidade psicológica, estado de infância
não vivida, que foi transferida para a idade adulta, porquanto em tudo e em
todo lugar o processo de crescimento é como um continuo parto que proporciona
vida, mas que oferece também um quantum
de dor.
Todos que atingiram o ápice do
equilíbrio emocional e espiritual atravessaram regiões pantanosas de natureza
moral entre amigos, correligionários e adversários, sem se permitir permanecer
nos redutos venenosos. Igualmente venceram muitos desertos e experimentaram
solidão e quase ficaram desamparados. Mas, porque se mantiveram pensando na
vitória e não apenas no caminho que deveriam percorrer, alcançaram os patamares
róseos do sentido existencial, da vida plena, sem ressentimento, porque perceberam
que a alegria sempre esteve presente durante o período áspero de esforço e de
sacrifício.
Compreenderam que a semente que pretende ser árvore deve
arrebentar-se para alcançar o destino que lhe está reservado. E, ao fazê-lo, veste-se de vitalidade e agita-se de
alegria, crescendo e tornando-se bela, até o momento que explode em flores e
frutos, sementes e lenho a que está destinada.
Da mesma forma é o ser humano, que
necessita experimentar as transformações naturais que o tiram do estágio de criança maltratada para a maturidade de
adulto realizado.
Nesse processo encontra-se embutida a
gratidão à vida e à oportunidade de ser pleno.
Divaldo Pereira Franco no livro, Psicologia da gratidão.
Trabalhado e editado por Adáuria Azevedo Farias. 31/08/2019.