sexta-feira, 1 de novembro de 2013


GRATIDÃO COMO NORMA DE CONDUTA

Do ponto de vista teológico pode-se considerar a gratidão como sendo uma virtude semelhante às demais, dentre as quais a fé, a esperança e a caridade.
Uma observação cuidadosa perceberá que, para se ser grato, é necessário possuir fé, ter certeza do significado da vida, dos seus valores e possibilidades; é indispensável acreditar no ser humano, considerando que, momentaneamente em transição para logros mais significativos, merece apoio e consideração que o ajudem a autossuperar-se, galgando mais elevado degrau da evolução. De igual maneira, no ato gratulatório encontra-se a esperança que aformoseia a vida, apresentando o futuro como algo a alcançar-se mediante a vivencia dos sentimentos enobrecedores, a certeza de que vale a pena todo e qualquer investimento que dignifica. E, por fim, torna-se presente a essência da caridade, que é o significado do ato de agradecer, expressando o amor que é vital para quaisquer investimentos de natureza moral e espiritual. Sem essa presença, a gratidão é pobre de vigor e de enriquecimento emocional.
Cada experiência vivenciada no processo da evolução, qual ocorre com a gratidão, representa uma forma adequada de amadurecimento psicológico, capaz de produzir harmonia interior e estimular o esforço para o autocrescimento.
Ainda não liberto dos atavismos, o self investe esforços para a sublimação da sua sombra, ao mesmo tempo influenciando o ego a respeito da necessidade de autotransformação das metas próximas para aquelas de ordem transcendente. Desmaterializar as ambições egoicas para transcendê-las em forma de aspirações psicológicas profundas que dão significado à existência deve ser-lhe o constante esforço no seu relacionamento com a persona. Fixada por interesses imediatos de respostas agradáveis, mesmo que mentirosas, a persona compraz-se em manter-se vibrante, mesmo quando constata não poder ocultar as necessidades emocionais daqueles que se lhe submetem cativos ao seu encantamento. Vestir-se de realidade, desnudando-se das fantasias e dos mitos enganosos, deve sempre ser a proposta do si profundo, por conhecer que é legítimo e proporciona harmonia em relação ao que é prazeroso, mas de sabor amargo e enfermiço para a emoção.
Ninguém pode viver ocultando a sua realidade, razão porque o tempo, na sua voragem inevitável, sempre retira os véus que disfarçam os contornos da existência e obscurecem a percepção da sua autenticidade.
É essa teimosa fuga de si mesmo que dá lugar nas criaturas a muitos conflitos e transtornos na área do comportamento, pelo consumo de energia emocional para parecer, em vez de aplicá-la no esforço natural criativo e renovador para ser.
Arquétipos novos podem, então, ser gerados, favorecendo a edificação dos significados da evolução, enquanto outros que são perturbadores irão cedendo lugar às novas formulações que proporcionam inefável alegria pelo seu cultivo.
Quando se é capaz do autoenfrentamento sem receio e como fenômeno próprio do autoamor, inúmeros tesouros da emoção podem ser descobertos e a alegria de viver deixa de ser através do consumismo e da troca de quinquilharias para adquirir conteúdos valiosos de amor, de intercambio, de paz e de gratidão.
A gratidão envolve-se em força estimuladora para todos os empreendimentos vitais, tornando-se uma forma, uma norma de conduta.
Quem é grato, naturalmente é abençoado pela felicidade, pela saúde, esparzindo as ondas de júbilo que o envolve, contaminando todos aqueles que se lhe acercam. Habitualmente, as referencias dizem respeito ao contágio do mal, das doenças, dos dissabores, da infelicidade, nada obstante também ocorre o que diz respeito à alegria, à esperança, à comunicação jubilosa, ao serviço edificante e à conquista da saúde.
A convivência com pessoas saudáveis permite impregnação de estímulos que já não funcionavam. Diante de alguém que sorrir abençoado pela conquista da harmonia pessoal, todos sentem um imenso desejo de alegrar-se também, de participar do festival do júbilo como ocorre ao botão de rosa que desata as pétalas, exteriorizando o perfume que lhe é inerente, abrindo-se delicadamente à luz do Sol.
Na etapa final da imaginação ativa é necessário que cada qual realize a sua experiência para que as verdades profundas se transformem em realidade. É o caso da gratidão, que necessita ser vivenciada, já que ninguém pode defini-la por palavras, de modo que outrem a possa sentir ou mesmo entender.
Kierkegaard afirmava que ninguém pode dar a fé a outrem. Isso porque se trata de uma conquista pessoal, intransferível. É possível, desse modo, crer-se no inacreditável, e estão embutidos aí todos os tabus e superstições que afloram do inconsciente coletivo e assumem realidade na imaginação daqueles que creem. Essas heranças arquetípicas de tal modo estão vivas no inconsciente que, ao ressumarem, modificam-se para realidades que impregnam aqueles que as vivenciam.
O mesmo pode-se dizer da gratidão. É uma experiência pessoal, embora possa também se expressar coletivamente, que não resulta de nenhuma herança arquetípica, sendo uma conquista do self, expressando libertação do comportamento egoísta. Há conquistas que somente se originam na experiência, embora possam ser formuladas teoricamente, tornando-se válidas somente quando passam pela vivência.
Afirmava Jung
“que cada avanço, mesmo o menor, através deste caminho de realização consciente, acrescenta muito para o mundo.”
A fim de que o indivíduo se liberte dos conflitos, especialmente daquele gerador da ingratidão, é necessário que tenha vida interior, que se organize internamente para expressar ao mundo aquilo que anela e alcançará. Não há por que ignorar-se o conflito, mas antes enfrentá-lo, envolvendo-o nos ideais e aspirações, reunindo a dualidade (gratidão e ingratidão) num todo harmônico, transformando-as em unidade (sentimento de gratidão) que passará a vigorar no dia a dia existencial.
Muitas vezes a gratidão se apresentará como sendo um paradox. Por que se há de agradecer, quando se pode prosseguir no prazer, ocorre que o prazer cansa, perde o sentido, produz o tédio, exige renovação. Ademais, nenhum prazer pode ter lugar no consciente sem que haja uma perfeita liberação do inconsciente, identificação dos fatores que o produzem, dentre os quais as pessoas, as circunstancias envolvidas. Ignorar todas essas condições é manter-se em delírio distante da realidade, que se impõe pela própria razão de ser. A gratidão, então, pode parecer paradoxal, pelo fato de manifestar-se também quando cessa o prazer, quando surgem a dor e a desdita, como sentido natural do processo da vida. Não fosse dessa maneira e se viveria em uma fantasia ativa que sempre alcançará a realidade existencial.
Nenhum paradoxo, portanto, na gratidão em todas e quaisquer circunstancias, como sentimento de júbilo pela presença da vida que estua triunfante.
Por fim, aplique-se o enunciado de Nietzsche, quando afirma:
“Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio. Ninguém, exceto tu!”.
Final do texto, porém o cap.10 TÉCNICAS DA GRATIDÃO, do livro Psicologia da Gratidão, escrita por Divaldo Franco, Espírito Joanna de Ângelis, continuará na próxima postagem.
Postado dia 01/11/13  

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