PERDER-SE E ACHAR-SE
O herói adormecido deve seguir adiante, buscar a sua identidade, sair
da proteção do Pai misericordioso, para
viver as próprias experiências. Talvez não seja necessária a forma como o filho pródigo tomou a decisão, mas uma
escolha levada pela própria maturidade.
Quando se quebram os
primeiros laços entre o filho e mãe a criança começa a dizer não. A sua
personalidade se vai formando, nasce a sua identidade que carece de independência
para amadurecer, para enfrentar os desafios.
O vínculo com o Pai, especialmente no sexo masculino,
pode durar por muito tempo como submissão, medo, interesse pela herança, falta
de iniciativa para suprir as próprias necessidades que tem sido atendidas sem esforço de sua parte. Transferindo a
responsabilidade dos seus atos ao Pai, o
filho não cresce psicologicamente, vivendo numa espécie de paraíso infantil, onde se sente bem, embora não realizado.
A experiência libertadora é
essencial ao crescimento interior e pessoal, e pode ser feita, sem traumas, sem
culpas, nem danos.
Muitas vezes, nessa
fantástica aventura de autoidentificação acontece o perder-se, para mais tarde
achar-se.
A sombra em forma do eu-demônio
apressa-se para que aconteça a ruptura, enquanto o eu-angélico perturba-se e introjeta a culpa, que ressumará do
inconsciente quando o indivíduo perceber-se perdido e sofrido.
É comum ocorrer
desenvolvimentos espontâneos e superiores na psique, quando chega a idade
adulta, mas, nela existem fatores de compressão e de regressão fortes, mostrando o erro que cometeu, abrindo espaço para
as reflexões mais sérias sem o ego, tornando
possível a correção do erro, sem prejuízo das qualidades morais adquiridas. Mas,
pelo contrario, graças a esses valores de enriquecimento interior, que ajudam
no discernimento, que propiciam o crescimento e contribuem com as forças
necessárias para a reabilitação.
O ser amadurecido pela dor
redescobre que tem um Pai misericordioso,
que nem sequer o censurou quando ele partiu ou dificultou a sua viagem, mas
que, com certeza o espera na sua afeição não ultrajada.
Essa
conquista da consciência do si-mesmo
é a chave mágica para a decisão de voltar
para casa, de retornar às experiências de identificação com a vida. Já não é
uma volta à inocência, ela
transformou-se em conhecimentos vários, em sofrimentos dignificadores, em
discernimento entre raga (a paixão, a
ilusão) e a realidade.
Não é
suficiente ser trabalhados o ego e a persona, fortalecidos e construídos
muitas vezes pelas experiências existenciais, mas o Self consciente. Quando se atinge a meia-idade essa reflexão é inevitável.
Mas, o mesmo fenômeno ocorre também, na juventude, após alguns traumas e
frustrações, desencantos e dissabores ante a realidade da vida.
Foi
o que pensou e fez o Filho pródigo,
no inferno em que estava. Ele sabia onde se encontrava o paraíso e necessitava do
estímulo que veio na forma de fome e humilhação, com a consequente
possibilidade de morrer.
Havendo
perdido a própria identidade, todos os valores que lhe constituíam a raça, suas
heranças, seus prejuízos e suas conquistas, ao trabalhar com porcos – animais
imundos na sua crença – em servir a um pagão,
pecando contra a fé religiosa – o seu Deus – a mais vergonhosa derrota tinha
sido essa, a de natureza moral, cujos fatores de perturbação se lhe somaram como
desonra, descrédito, abandono, miséria física e econômica, decorrentes daquela de
natureza espiritual.
No
processo de conquista da consciência, por desconhecimento da realidade, por
presunção e fatuidade, muitos perdem-se e caminham imaturos no prazer,
desperdiçando a juventude e os tesouros que lhe são pertinentes, até o momento em que
surge uma seca, faltam as energias
para continuar e o indivíduo cai em si, avaliando
tudo que tinha e que não mais dispõe, sabendo que na terra longínqua onde vivia, tudo existe em abundância.
Não busca
mais conquistar o que perdeu, porquanto há recursos que não voltam como:
energia, juventude, pureza de sentimentos, mas outros podem ser restaurados
tais: dignidade, trabalho, renovação, novos logros.
Ao Filho pródigo, um lugar entre os
trabalhadores lhe era o bastante, mas ele foi restaurado pelo pai que o
reabilitou, vestindo-o e calçando-o com nobreza, lhe pondo o anel de distinção
e de união.
Tudo
isso porque ele estava perdido e foi
encontrado, estava morto e vivia.
Considere-se
o fato, como o do amor de Deus, em relação às suas criaturas, Seus filhos
rebeldes que Lhe abandonam a casa paterna
e fogem para o país longínquo da
loucura e da ingratidão, entregando-se à ilusão, esquecendo-se da sua origem
divina, dispersando as forças elevadas que lhe são concedidas para o
desenvolvimento espiritual, moral e intelectual, entregando-se ao servilismo
com os animais imundos – as paixões
primitivas – disputando as bolotas – insistindo no primarismo
ancestral – porque está perdido, mas podendo
autoencontrar-se .
Como
parte da trilogia dos perdidos – a ovelha,
a dracma e o filho pródigo – essa parábola também compõe a tríade do encontro,
da esperança, da misericórdia, do júbilo.
Achar-se
é mais importante do que achar.
Achamos
coisas, animais e pessoas perdidos, mas, achar-se, quando se está perdido em si
mesmo e não no espaço-tempo, é de grande importância psicológica, de verdadeira
cura, de reabilitação, de autoencontro, de amadurecimento para o estado numinoso.
É preciso,
nesse instante, trazer a ímago Dei na
consciência como referencia a fim de
sair do ego extravagante e ditador, lembrando do Pai misericordioso que sempre espera e
que, reencontrando o que estava perdido, alegra-se, propõe e faz uma festa, conservando
a união que foi perdida quando o irresponsável fugiu para longe...
A persona está sempre mudando no processo
existencial porque ela é resultado das conquistas psicológicas e morais, embora
o ego se demore na sua dominação, enquanto
conquista recursos para interagir com as novas conquistas. Nos períodos de
mudança biológica, conforme colocado anteriormente, essas mudanças ocorrem com
naturalidade, atingindo seu ponto culminante na fase adulta-velhice, quando o
período é saudável.
Vive-se
hoje na Terra, não mais o ciclo das culturas
da vergonha e da culpa, mas o do narcisismo, do exibicionismo, da falta de
censo e de pudor, da extravagância, do poder...
Mesmo
assim, a psique mantém a herança da culpa e da vergonha no inconsciente
individual e ainda quando anestesiada por situações e acontecimentos casuais,
locais, sociológicas, são sempre de duração rápida, porque vem a tona e se
expressam de forma patológica com transtornos de comportamento e síndromes de doenças
originadas por somatização.
Compreende-se
que o necessário sair de casa para fazer-se
herói, não tem que passar pelo
insucesso, mas que depende, da maneira escolhida para essa experiência.
Achar-se
é uma necessidade do si-mesmo para vivenciar
a alegria de viver, não caindo em distúrbios de conduta, lamentáveis e
dolorosos.
Quando
se pensa que o Cosmo possui um
sistema de natureza moral, organizador, percebe-se com alegria que a vida
oferece processos evolutivos que levam ao engrandecimento pessoal e à plenitude
ou individuação.
Pode
ser alcançado esse crescimento sem se passar obrigatoriamente pelo insucesso do
ego pelas incertezas do Self, fazendo a viagem de volta a casa, com alegria.
Jesus
concebeu e expôs a Parábola do Filho
pródigo, e mais as duas outras, as dos perdidos, para mostrar que Ele veio
para esses sofredores e desorientados, que Ele encontraria e os reconduziria às
suas origens, na doce expressão do Pai
misericordioso, no que conseguiu com vitória retumbante, demonstrando, aos
seus antagonistas que, de alguma forma, eles estavam perdidos, mas que também
estavam sendo encontrados, tendo a oportunidade de voltar à casa paterna...
O
desafio de Jesus continua na atualidade com as mesmas características,
representadas no Seu chamamento à consciência de felicidade, naturalmente para
aqueles que a perderam ou não a tiveram, ante o crivo dos novos fariseus
presunçosos e enganados com relação à vida e ao seu determinismo.
São,
por enquanto, Filhos pródigos saindo
da casa paterna, para desfrutar as
heranças divinas no país longínquo.
Trabalho
executado com base no livro Em Busca da
Verdade, escrito por Divaldo Franco, Espírito Joanna de Ângelis. Postado
dia 04/03/2014.
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