A
GRANDE CRISE EXISTENCIAL
Apesar
dos conflitos que a fé religiosa produziu em muitas vidas, principalmente nos dias da idade média, em que
prevaleciam a ignorância, o temor e o absolutismo do poder clerical, o
arquétipo espiritual tem sido uma necessidade para o desenvolvimento
psicológico do ser. Infelizmente, personalidades psicopatas, na sua maioria,
temerosas da vida e condutoras de conflitos refugiam-se nas doutrinas
religiosas, como noutras áreas da sociedade, mas especialmente nas primeiras,
ocultando os seus dramas e medos, ao tempo que, em nome da salvação, castram os
valores intelectuais e a sensibilidade dos crentes, submetendo-os aos seus
caprichos e insânia.
Proíbem
tudo que possa trazer alegria de viver, liberdade de pensamento, ampliação do
sentido da vida, dignificando a experiência humana, porque estão conturbados e
invejam os saudáveis. Condenam tudo que é sofrimento, pela covardia diante do
autoenfrentamento, preferindo a sombra à plenitude do Self.
Toda
religião, no seu significado profundo, busca religar a criatura ao seu Criador,
o que representaria estabelecer o eixo pleno ego-Self, o ser aparente com o
real, trazendo-lhe condições de saúde e de paz.
Ao
invés disso, as mentes sofridas e mal desenvolvidas, os Espíritos angustiados,
autosupliciando-se, como se os seus corpos fossem os responsáveis pelos
pensamentos e conflitos resultantes da fissão da psique no anjo e no demônio,
com predomínio do último, diante das tendências ao sofrimento não ultrapassadas,
evitavam o mundo e o odiavam em conduta masoquista.
É
natural que o desenvolvimento da sociedade e as conquistas da inteligência, a
partir do período industrial, da revolução inevitável imposta pelo progresso, passassem
a combater esse parasitismo emocional e retrocesso cultural, abrindo portas a
novas experiências e desmistificando as fantasias das condenações infernais e
das punições divinas.
Com
segurança aos poucos, as filosofias do positivismo, do existencialismo e do
niilismo apresentaram o lado agradável
da vida, as belezas que existe em tudo e por toda parte, as concessões do
prazer e do ter, as novas experiências do conhecimento, conquistando as
multidões.
Ao
mesmo tempo, a ampliação dos conceitos sobre
o universo e sua grandeza, afastou os antigos fregueses das religiões dos
arraias da fé para a convivência com outro tipo de realidade que desmentia suas
afirmações, agora fáceis de ser comprovadas, abrindo espaço ao cepticismo, à
crítica dos seus textos e dogmas, bem como ao abuso originados pelos excessos.
A
hipocrisia religiosa não pode suportar a realidade dos comportamentos humanos quebrando
os limites que foram colocados no passado, lançando-se com excessiva sede nos
usos que se transformaram em abusos com consequências também nocivas.
Os
avanços da ciência apoiada na tecnologia dignificou a vida, trazendo uma visão
otimista e encantadora da vida humana, aumentando o seu poder até chegar aos
extremos de tornar-se onipotentes, de tal forma, que nada se faz sem a sua
contribuição, chegando-se a considerá-las os novos deuses do universo cultural
da atualidade.
A
era industrial revolucionou os padrões de comportamento vigentes, e o ser
humano aos poucos submeteu-se às máquinas que concebeu e criou, tornando-se
servos obedientes.
A
ganancia de ter mais ampliou o seu desempenho, encantando os governos das
nações poderosas que enlouqueceram pelo fascínio de mais conquistar,
submetendo, pouco a pouco, os outros povos ao seu domínio arbitrário, disfarçado
ou não, por meio das falsas ajudas aos países em desenvolvimento, explorando-os
e escravizando-os, utilizando política arbitrária e mecanismos perversos de controle através de agencias
de espionagem e de corrupção, alcançando culminâncias de glórias e recursos, como ilhas fantásticas no meio de
oceanos de miséria à sua volta. Como também, com habilidade e sem escrúpulo, provocar
as guerras de extermínio, em nome de suas raças prepotentes, ditas superiores
pela cor da epiderme, pelo sangue, pela tradição...
O
ser psicológico é livre, mesmo quando submetido a circunstancias e situações
indignas e escravistas. A sombra predomina na conduta, mas o Si-mesmo é
orquestrado pela esperança e pelas aspirações de liberdade e de triunfo.
Pode-se
observar essa situação conflitiva nos campos de concentração de trabalhos
forçados e de extermínio, quando judeus, colocados como kapos, para vigiarem
seus irmãos de raça, apresentavam, muitas vezes, mais crueldade do que a dos
seus indignos comandantes.
Conta-se
um desses momentos, quando um kapo luta fortemente com um pai, para que esse
lhe dê o filho que seria levado à câmara de gás. No esforço feito pelo pai da
vítima, esse gritou-lhe: - Você não tem filho, para ter uma ideia do que é
perder-se um de forma tão malvada? E ele respondeu, trêmulo: - Sim, é claro que
tenho. Por isso sou obrigado a eleger cinco crianças para a câmara, conforme
solicitaram-me, ou o meu filho irá no lugar vazio...
A
sombra enlouquecida não tem a dimensão da loucura e o ego torna-se de uma
crueldade sem limite.
É
importante lembrar outro doloroso momento de crueldade e infâmia no período em
que a Polônia sofria o drama do holocausto, quando os sicários pediram a um
rabino do gueto que escolhesse expressivo número de judeus para as câmaras de
gás, e ele, ameaçado, optou pelo suicídio na difícil situação, não se tornando
algoz dos seus irmãos. A outro, que o substituiu, foi feita a mesma absurda
proposta, e ele viu-se na contingencia de eleger os que seriam assassinados, percebendo
depois que foi enganado pelos agentes da crueldade...
São
difíceis as soluções em circunstancias dessa natureza, quando o Self perde a
dimensão da sua espiritualidade e deixa-se dominar pelo ego da sobrevivência
física comandado pela sombra e os
arquétipos da esperança, da felicidade e do significado passadas aquelas horas
intermináveis...
A
perda do sentido espiritual e religioso produziu seres insensíveis, cruéis e
sem compromisso com a vida e os valores
transcendentais, trazendo como resultado a situação deplorável da falta de
respeito por si mesmos, pelos demais e por tudo, incluindo a Natureza.
Esse
desvario, num crescendo alucinado, proclama o prazer pessoal acima de todas as
circunstancias, apelando para a morte, quando aparentemente surge qualquer
ameaça ao seu ego exacerbado, que exige prazer até a exaustão.
Não
é outro o fenômeno que diz respeito ao aborto provocado, como instrumento de
libertação da responsabilidade e do trabalho, embora sabendo-se que a
coabitação sexual, como é natural, leva à concepção que poderia ser evitada
pelas pessoas egoístas que não querem responsabilidade e se enganam, pensando
sempre no eu insensível, até o momento futuro da solidão e da amargura.
Assim
também, o crime da eutanásia, quando o paciente não quer viver o processo degenerativo,
os fatores vindos das enfermidades, as situações purificadoras pelo sofrimento,
exigindo a interrupção da própria existência, em terríveis atos suicidas
assistidos, ou quando a família resolve interromper a vida de um dos seus membros
que lhe esgota os recursos com os procedimentos médicos de alto custo...
Junto
com esses carrascos psicológicos da sociedade contemporânea, que sofre os
efeitos dessas amargas decisões, o suicídio aumenta em estatística, motivado
pelo niilismo que tudo aponta à consumpção da vida pela morte.
Uma
sociedade que mata fetos indefesos, idosos e enfermos irrecuperáveis e
justifica-se, como pode tornar-se fraterno e solidário? Como quebrar esse gelo
emocional de mulheres e de homens interessados apenas no momento passageiro
pelo qual passam, sem pensar na própria situação, logo mais?
Não
se estranhe a tragédia do cotidiano, a crise existencial que toma conta dos
indivíduos e da sociedade.
Uma
nova religião psicológica, sem cultos nem dogmas aos poucos surge, a partir da
visão holística de Jung, que vivenciou inúmeras experiências mediúnicas com a
jovem prima Helena Preiswerk, na intimidade do lar, na personificação que o
dominava uma vez ou outra, revendo-se como alguém do século anterior.
O
Espiritismo, doutrina positivista, fundamentada nas experiências sociológicas e
transpessoais da imortalidade do ser, do seu triunfo sobre a morte, da
multiplicidade das existências, respondendo pelo conhecimento arquivado no
inconsciente coletivo, oferece as certezas para o avanço do ser que se é, o
verdadeiro imago Dei, no rumo de Deus...
Com
certeza, aquele que está acima das descrições bíblicas, que somente dão uma
pálida ideia arquetípica da Sua realidade que supera a conceituação
antropomórfica, abarcando o Universo como Causalidade e fatalidade de tudo e de
todos.
Jung
afirmou com ênfase: - “Através da minha experiência, eu conheço um poder maior
do que meu próprio ego. Deus – é o nome que dou a esse poder autônomo”,
portanto, fora dele e dominante nele.
Para
que a culpa apareça, é necessária a presença de Deus na consciência, mesmo que
sem dar-se conta, porque é através da Sua transcendência que o individuo possui
o padrão interno do que é certo e do que é errado. Ei-lO, ínsito no mais
profundo abismo do Si-mesmo.
Na
sua obra monumental, o Aion, ainda se refere o admirável mestre: - “Cristo é o
homem interior a que se chega pelo caminho do autoconhecimento.”
Esse
Cristo ou estado crístico alcançado por Jesus, como Médium de Deus, foi
alcançado por Paulo o apostolo, e por muitos discípulos que se Lhe entregaram
em totalidade, e ainda pode ser conseguido quando se atinge o estado numinoso,
tornando-se livre dos processos reencarnatórios, das imposições penosas do
corpo, das circunstancias impositivas da evolução.
Auxiliar
na conquista desse estado, é missão da psicoterapia profunda, trabalhando o ser
integral, rompendo a concha grosseira onde a sombra muitas vezes se esconde,
evitando ser identificada.
Dessa
crise existencial que desestrutura o ser humano, transformado em máquina de
prazer, que logo se desgasta e decompõe, surgirá uma nova proposta de
humanização do ser que se erguerá da decadência para a valorização do divino que
nele existe, dos sentimentos que engrandecem, que elevam moralmente e dão real
significado existencial, trabalhando-o para que, como célula social, ao
transformar-se para melhor contribua para o conjunto.
Será,
então, possível acreditar no mundo melhor, saudável e abençoado, onde seja
possível amar e ser amado, construir para sempre sem medo e sem perda,
conquistando o infinito que está ao alcance...
Texto
trabalhado com base no livro Em Busca da
Verdade, escrito por Divaldo Pereira Franco, ditado pelo Espírito Joanna de
Ângelis.
Postado
no dia 30/03/2014.
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