quinta-feira, 27 de março de 2014


AS CONQUISTAS EXTERNAS
 

O processo de evolução antropológica tem sido um grande desafio da vida, o que vem produzindo mudanças nas formas e funções orgânicas, permitindo o desenvolvimento das faculdades mentais até alcançar a grandiosa área da inteligência e dos sentimentos. Por isso o instinto, na sua inteireza, já é uma forma de inteligência embrionária, por criar os condicionamentos que, mais tarde, a razão irá ampliar até proporcionar a compreensão dos conceitos sutis e das abstrações ... 

As razões para a sobrevivência desenvolveram os instintos agressivos que predominaram no ser humano por milênios e, quando ocorreu a conquista dos padrões da razão e o seu estabelecimento no âmago do Espírito, aquelas heranças continuaram com forte domínio no comportamento. A libertação lenta do primarismo e a aspiração do belo e do nobre, o deotropismo se vêm impondo, de forma que a consciência hoje pode administrar os impulsos violentos, orientando-os para as ações de edificações, sem traumas nem conflitos.

Apesar disso, o individualismo, filho da conquista do materialismo, que se mostrou contra as imposições absurdas do religiosismo exterior, sem significados internos, expressa-se, hoje, como uma forma incompleta autorrealização, levando o individuo a ter, a destacar-se, a conquistar o que deseja de qualquer maneira, tornando-se consumista insaciável e inquieto. 

Diante desse instalado pós-modernismo, atribui-se à ciência valores e significados quase divinos, dando a impressão de que é  incorruptível e insuperável, ao mesmo tempo  que as referencias pessoais nos relacionamentos que não se aprofundam, ficando sempre na superficialidade, tornam as afeiçoes descartáveis, como tudo quanto se compra com a sede de ter.

Os afetos são ligeiros e medrosos, oportunistas e descomprometidos, com medo cada qual de ser dominado pelo outro, evitando submeter-se, o que se caracteriza como pequenez, falta de personalidade, risco de perda, quando se estabelece a dependência...

A grande confusão entre afetividade e interesse sexual, entre amor e compensações sentimentais, responsabiliza-se pelo desinteresse da convivência fraternal saudável, sem interesses subalternos, deixando-se a sombra  dominar todos os espaços do ego, ao tempo em que não se abrem as possibilidades psicológicas do Self para a realidade.

As artes, que sempre tem expressado o estágio evolutivo, politico, comportamental da sociedade, nestes dias conturbados, são agressivas e destituídas, em muitas áreas, de propostas elevadas de beleza, expressando apenas os conflitos, as aspirações doentias, a revolta e o desânimo dos seus portadores. A música, por exemplo, descendo do pedestal das musas, enveredou pela contracultura, pelos desvãos da ironia, da perversão moral, do deboche, da agressividade, do duplo sentido com destaque para o pejorativo, como se o ser humano devesse sempre reagir, mesmo quando pode agir, se deixar cair no desespero, quando poderia aspirar pela alegria real de viver, modificando o status quo e contribuindo para um mundo melhor, onde é possível a vida expressar-se em harmonia e grandeza.

Impossibilitado de conduzir os povos, por se haverem perdido nas malhas da burocracia e nos interesses partidários, os governantes da Terra aturdidos, demonstram não saber o que fazer nem como fazê-lo. Permitem a desorientação das massas, a sua revolta contínua, por esquecimento das responsabilidades não cumpridas e que foram apresentadas nos seus programas eleitoreiros enganando o povo desorientado.

Surgem, revoltas, revoluções, amolentamento do caráter e perda da moral, com reações em cadeia, cada vez mais violentas e ameaçadoras, porque os limites da ordem e do respeito foram superados pela não fronteira da rebeldia.

Os esportes, que sempre constituíram oportunidades excelentes para catarses coletivas, competições saudáveis, alegrias e entusiasmo coletivo, transformaram-se em fontes mafiosas de domínio e de conquistas financeiras, construindo deuses frágeis que logo tombam do pedestal, tornando-se campo de batalha pelas torcidas ferozes que digladiam com frequência em sucessivos espetáculos deprimentes que culminam com a morte de alguns dos seus fanáticos...

O desrespeito pelos valores internos do ser humano propõe a significação das suas conquistas exteriores, tornando-o avaro e pretensioso.

A falta de concentração das pessoas nas questões importantes do ser interior tem contribuído para a futilidade em triunfo e o desconhecimento da sua realidade, crendo ser a vida esse passeio fantástico pelo país da pressa dourada, em que tudo é de efêmera duração, não permitindo a reflexão e o encontro com a consciência, com o Si-mesmo . Essa sombra teimosa consegue separá-las do eu divino que existe no íntimo e de que se constitui, sendo necessário transmudar esse material inferior num processo alquímico emocional, para realmente encontrar o significado existencial.

Ter em mente a presença da sombra, a fim de vencê-la, é necessidade psicológica inadiável, como nos  contos de fadas, nos mitos ancestrais, permitindo a liberação do ser oculto, misteriosamente transformado pela magia da ignorância (A bela e a fera, O príncipe sapo, Branca de neve, A bela adormecida etc.)

Com essa consciência, fica claro que não adiantam as lutas externas, os combates inglórios contra os outros, a ânsia de superar os competidores, o desejo de ultrapassar os demais, por insegurança pessoal, permitindo-se encontrar e viver-se o sentido da vida. Ninguém pode viver de maneira saudável sem o culto interno da integração da fé religiosa com a razão numa harmonia estimuladora ao prosseguimento dos embates inevitáveis do dia-a-dia, haurindo confiança nos momentos difíceis e renovando a coragem na ameaça do desanimo. Esse sentido da vida não pode ser desenhado pelos hábitos externos, mas construído de forma subjetiva, idealista, interior, com o enriquecimento das aspirações que engrandecem a existência. De forma definitiva é impossível, viver-se sem o sentimento dos conceitos eternos, que dão dignidade à criatura humana, proporcionando-lhe ética e moralidade para ser fiel aos objetivos existenciais.

Com essa percepção, descobre-se que os conflitos, as aflições em torno das posses e o medo de perde-las são fenômenos pessoais interiores da própria insegurança, levando a transtornos de comportamento e distúrbios orgânicos repetitivos.

A verdadeira psicoterapia leva o indivíduo a redescoberta da sua realidade, da sua origem espiritual, da finalidade existencial, do seu futuro imortal que se lhe transformam em alicerces de segurança para as lutas contínuas, evitando a projeção dos seus conflitos nos outros, assumindo a culpa e libertando-a do inconsciente que se encontram produzindo sombra  e sofrimento.

Quando Jesus enunciou que é necessário tomar a sua cruz e seguí-lO, Ele propôs a conquista da autoconsciência, a definição para assumir as próprias responsabilidades, ao invés de permanecer-se divagando em torno de como encontrar o melhor processo para o equilíbrio, que não se expressa em formas exteriores nas fugas de transferência de responsabilidades, ou para os prazeres que se extinguem, por mais que continuem...

A psique precisa de apoio transcendente para proporcionar elementos dignificadores, por intermédio da realidade em que todos estão mergulhados, elegendo aqueles que são mais compatíveis com as aspirações e as possibilidades, de execução.

Todos dependem de Deus, porque, afinal, estamos mergulhados em Deus, mas é necessário reconhecê-lO em nós, para que O manifestemos através do comportamento emocional e das ações sociais, familiares, espirituais...

Quando perguntaram a Jung se ele acreditava em Deus, disse com humildade e sabedoria, que não necessitava de crer, informando: - Eu sei, não preciso acreditar...

Existe uma luta contínua para definir-se Deus e atribuir-Lhe apenas caráter religioso, limitando-Lhe a grandeza, o que permite àqueles que pensam e se libertaram das crenças ligeiras, negá-lO, porque a sua visão é mais ampla e abrangente do que a proposição do fanatismo religioso. Se for considerado como a vida, por exemplo, passa a existir naquele que O imagina, pois a Sua realidade somente pode ser aceita pela consciência depois que se começa a concebê-lO.

Sem um valor maior, que mereça investimento, ninguém vai à luta, ao sacrifício, porque tudo que é superficial cedo perde o sentido. É assim como alguns tipos de metas humanas, que são imediatas, como conseguir coisas, posses, amealhar fortuna, conviver com pessoas, e ao alcançá-los, terminando o objetivo, surgem as frustrações e as decepções.

Há pais que se entregam à educação dos filhos, depositando neles todas as suas aspirações e insatisfações, esperando compensação quando eles se tornarem adultos. Quando isso ocorre, e os descendentes são convidados a seguir sua própria vida, atormentam-se, acreditando-se abandonados, sofrem depressões, perdem o sentido da vida...

O significado da vida não é esse compromisso breve da existência.

O mesmo acontece com o trabalho, com a carreira profissional, com as aspirações políticas e culturais, artísticas e religiosas... Alcançando o patamar programado, a ausência de nível mais elevado conduz ao tédio, ao desinteresse, à perda de sentido da vida...

Isto porque a educação infantil é feita de ilusões que escravizam e se transformam em metas primordiais, tornando-se uma proposta neurótica, sem significado. Descobrir o destino e trabalhá-lo, programar essa fatalidade honorável e saudável é o objetivo da vida, aquele que propicia saúde integral, porque não é conquistado de um para outro momento, não se limita a encantos passageiros, não é monótono, apresentando-se sempre novo e a um passo à frente.

Conforme a religião enfraqueceu nas famílias, o desinteresse pelo ser espiritual também sofreu atrofia emocional, deixando-se que cada um escolha, quando oportuno, o seu conceito de vida e de espiritualidade, como se fosse acreditável permitir-se que alguém primeiro se contamine de alguma doença e depois expor-se aos perigos que a mesma proporciona.

A criança deve sentir a importância da família, compreender o significado desse grupo social reduzido, para poder conviver com a outra, a social e ampla, com ideias religiosas liberais e enriquecedoras, para então amadurecer psicologicamente com segurança e respeito pela vida.

Uma visão infantil bem trabalhada pelos pais e educadores continuará conduzindo-lhe a vida para toda a existência. Os diferentes símbolos de cada fase etária serão decodificados e transformados com naturalidade sem choques nem perdas, substituídos por outros mais oportunos e significativos, que vão abrir espaço para o encontro com a realidade existencial sem os fantasmas nem bichos-papões.

Os mitos pessoais, as fantasias, os complexos e os sonhos não realizados quando se expressam naturalmente, são superados pelas conquistas do discernimento e da razão, da contribuição da psique, unindo as duas fissões numa só significação.

 
Texto trabalhado com base no livro Em Busca da Verdade, escrito por Divaldo Pereira Franco, ditado pelo espírito Joanna de Ângelis,  

Postado dia 27/03/14.

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