sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014


 VOLTAR PARA CASA

 

A volta para casa é uma viagem cheia de alegria, de belas expectativas, de lembranças queridas, das raízes, de segurança do conhecido ante o bravio mundo desconhecido.

O Pai misericordioso é apoio e amparo, mesmo na parábola, em momento algum ele recalcitra, seja no instante quando o filho deseja aventurar-se na loucura, iludindo-se com a possibilidade do autoencontro adiante, ou no da volta, sem nenhuma reprimenda.

Em casa, conhecido lugar de desenvolvimento dos valores profundos do ego e da afirmação do Self, existe alegria em razão da simplicidade, dos recursos que propiciam a saúde e o bem-estar, mas também pode asfixiar ou afligir, por falta de liberdade total em que se possa expressar.

Não se pode ser livre in totum, em razão dos limites impostos pelas leis e mesmo pelo organismo que, de alguma forma, é um ergástulo necessário para a evolução.

Esse Pai, no entanto, deseja a felicidade do filho, ele pode estar configurado no superconsciente, em expectativa agradável de que tudo será resolvido, e para que isso ocorra, compreende as desilusões e as experiências malogradas que aquele viveu, não lhe aumentando a carga de culpa nem de remorso, mas liberando-o, para que possa estabelecer definitivamente na confiança e na renovação.

O filho, não sendo censurado, não sente vergonha, não experimenta constrangimento.

Mas aquele Pai misericordioso também não reclama da conduta do outro filho ciumento, em difícil trânsito da adolescência para a vetustez da maturidade, porque a dor que experimenta já é uma forma de punição em referencia à sua conduta. Esforça-se por diluir-lhe a mágoa, justificando que tudo que tem é dele, que ele tem estado ao seu lado, portanto, desfrutando de segurança e de alegria.

Merece consideração o detalhe da oferta de um anel que o pai faz ao transviado, esse elo de vinculação profunda, a fim de restabelecer a ligação que fora interrompida pelo ego inquieto, doentio. O anel será um símbolo de bem-estar, auxiliando na cura dos tormentos que se demoram no seu mundo interior.

As sandálias, que também lhe manda pôr aos pés, são de relevante significado, porque revelam prestígio social. Os descalçados são a representação da penúria e do desprezo, psicologicamente aqueles que não tem apoio para a marcha, que se acreditam destituídos de recursos emocionais para os enfrentamentos, já fracassados, porque perderam os chinelos de proteção aos pés andarilhos, agora impedidos de avanço, porque abertos em feridas, vitimados pelos espículos e pedrouços do caminho. Esses impedimentos são as atrações perturbadoras, os prazeres insanos, os gozos intoxicantes...

Por fim, chegando a casa, o filho recebe um manto que o iguala ao pai e ao irmão, um suspiro de confiança, torna-se, dessa maneira, um igual, alguém querido que merece respeito.

O Pai misericordioso abre-se ao self do filho e agasalha-o no manto de púrpura que ele próprio veste, assim como o possuem o outro filho e os seus convidados de destaque.

Em casa, não há lugar para a inferioridade do retornado, porquanto o amor a todos iguala, dando-lhes oportunidade de crescimento e de iluminação.

As criaturas tendem a manter posturas de tristeza, melancolias prolongadas, conflitos em torno do existir. Mesmo quando tudo convida à reflexão da alegria, desde um botão singelo de rosa que desabrocha aos beijos cálidos do Sol à magnitude gloriosa do nascer do dia.

A sombra densa dos atavismos reeencarnacionistas nelas permanece perturbadora, patológica, anulando a alegria natural da experiência de viver e de renascer, sendo cultivada em forma de transtorno masoquista e afligente.

Deus é o mais extraordinário exemplo de alegria, conforme Jesus sempre o decantou. É o Pai dos felizes e dos angustiados, a todos oferecendo a incomparável oportunidade de reencontrar-se na estrada evolutiva, de recomeçar quando equivocado e de prosseguir enriquecido quando eficiente e produtivo.

A própria mensagem do Carpinteiro galileu é um hino de júbilo, porque Ele não possuía sombra, era todo numem, convidando à satisfação do desenvolvimento psicológico e social, de forma que todos pudessem desfrutar de felicidade, conforme a preconizava e vivia.

 

A sua mensagem é libertadora, produzindo bem-estar e autorrealização, conferindo valores existenciais que permaneciam adormecidos.

A fuga para a tristeza produz infelicidade, porque as densas trevas de desinteresses pelo desenvolvimento do Self tornam o ego mais castrador e impeditivo de experimentar solidariedade e harmonia. Enquanto vicejem os conflitos defluentes da melancolia, da insatisfação, da queixa, pode-se fugir para a autoanulação, para a morbidez existencial.

Na parábola, as vestes oferecidas ao Filho pródigo denotam renovação e rejuvenescimento, recomeço e beleza. A sombra cede, imediatamente, lugar ao entendimento, favorecendo sentimento de igualdade em relação às demais pessoas, sem a presença de qualquer conflito perturbador.

Os andrajosos físicos também quase sempre se encontram descuidados psicologicamente, atirados ao fosso do descaso, da indiferença, desejando não ser notados, excluídos que se fazem por conta própria do meio social. Morrendo, desejam desaparecer, não deixar vestígio.

O Pai misericordioso sabia que o seu filho necessitava de roupas novas, de identificação pessoal com as demais pessoas. Não era um réprobo de retorno, um fugitivo que estava sendo recebido, mas o filho que fora na busca de si mesmo e não conseguira o êxito. Tornava-se necessário que estivesse com a veste própria para a festa que logo mais se faria em sua homenagem, de maneira que se não sentisse inferiorizado.

A festa é sempre a maneira de celebrar-se o retorno dos triunfantes, mas, naquele caso todos celebrariam o valor do pai, a segurança do lar, a vitória do bom senso e da realidade da ilusão.

O amor é luz que se espraia em todos os sentidos, a tudo envolvendo na mesma claridade, sem excesso no epicentro nem diminuição a distancia.

Os dois filhos para o pai, eram as estrelas da velhice assim como as aspirações de nobreza que todos devem possuir e manter em desenvolvimento contínuo rumando para o logro da individuação.

O Filho pródigo não apenas foi recebido, mas também abraçado pelo Pai.

Há muitas maneiras de receber-se quem chega de viagem. Naquele caso, somente havia júbilo, porque há mais alegria quando se encontra a ovelha perdida, conforme acentuou Jesus.

Nas lutas de sublimação dos valores egóicos, que se devem transformar em claridade no imo do ser, há um abraço paternal da saúde real em relação aos múltiplos distúrbios da jornada evolutiva.

Esse abraço expande-se, albergando, também o outro filho, o insatisfeito, que pode ser também o eu demônio da fissão da psique.

Trabalhar pela fusão desses antagônicos eus constitui o desafio psicológico da busca do estado numinoso, no qual não há espaço para sombra alguma, suspeita injustificável, aceitação de tormento ou de conflito.

O processo da volta para casa após a jornada pelo país longínquo é feito de experiências libertadoras de crescimento e amadurecimento emocional, de superação dos tormentos infantis que permanecem dominadores na personalidade, de identificação com realidade desafiadora que deve ser vivida com entusiasmo.

O filho é uma experiência juvenil, pois que avança para tornar-se pai, no processo natural da perpetuação da espécie.

A longa experiência da filiação irá oferecer-lhe madureza para a paternidade responsável, sem os descaminhos das emoções exacerbadas.

No inconsciente individual, quando alguém se recusa ao autoconhecimento, provavelmente está negando-se à futura paternidade/maternidade, que a vida impõe, seja sob o aspecto biológico ou afetivo.

Não apenas é genitor aquele que reproduz, mas também quem ensina, quem educa, quem se responsabiliza e guia, numa pater-maternidade espiritual de longo significado, que muitas vezes se torna mais representativa do que biológica. Essa última é automática, impositivo da união sexual, enquanto a outra é optativa, espontânea, idealista, libertadora.

Quem se isola na tristeza, negando-se a claridade da alegria e a música do júbilo, encarcera-se na soledade, sem reproduzir-se em afeto ou em dedicação, podendo ser considerado, conforme a parábola da figueira que secou, muito simbólica, em relação às vidas ressequidas, não produtivas, que se tornam inúteis, muitas vezes pesando na economia da sociedade, sem esforço para tornar-se contribuinte, optando por dependência, a doentia dependência infantil.

Cada período existencial apresenta-se como ensejo de alcançar-se a próxima etapa, mais amadurecido, mais lúcido.

É o que anela o Pai amoroso da parábola. Aqueles filhos seriam pais um dia e era necessário que compreendessem, desde cedo, que o afeto não tem limite, seja qual for a circunstancia que se apresente. Quando exige, toda vez que se impõe, torna-se capricho emocional ao invés de alimento da vida.

Esse crescimento na direção da paternidade/maternidade independe da cultura, da posição social, de recursos financeiros, por tratar-se de amadurecimento interior, de reflexões profundas que se derivam das experiências existenciais nas mais diferentes expressões da reencarnação.

A culpa do filho pródigo cedeu lugar à confiança do amor do pai, de tal forma que não teve pejo em desculpar-se, em expor-se, em apresentar-se desnutrido, descalçado, malvestido, em situação deplorável, porém, vivo e confiante.

Não ouviu do Pai generoso as expressões usuais do perdão, ao lado da repreensão, do acolhimento, mas também da queixa pelo tempo que foi malbaratado, ao lado da fortuna que foi desperdiçada. Encontrou abrigo e compreensão, oportunidade renovadora, como se nem sequer houvesse ido ao país longínquo, porque jamais se afastara do seu coração bondoso.

Esse é o mais elevado troféu do sentimento de paternidade, de dever humano e social, de construção da vida em todas as suas expressões.

Quando se deseja paz mediante lutas, alegria entre vexames e queixas, somente brumas e sombras surgem empanando o Sol da vida.

A volta para casa é inevitável, porque todos retornarão ao país longínquo-próximo da Espiritualidade de onde veio para a experiência de crescimento e de desenvolvimento do deus interno.

Transgrida-se ou não o compromisso de respeitar os tesouros de que se dispõe, a volta é inevitável, porque essa é a finalidade existencial do processo imortalista.

O ser humano é construído para a plenitude do Self, após as inevitáveis experiências de ida e de volta para casa.

Trabalho elaborado do texto ENCONTRO E AUTOENCONTRO do livro Em Busca da Verdade, peo Espírito Joanna de Ângelis, psicografado por Divaldo Pereira Franco.

Postado em 21/02/2014.

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