segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014


Um país longínquo

Os problemas afligentes, que surgem como enfermidades de vário porte, conflitos diversos, à medida que se dão as colisões operam despertamentos e surgem oportunidades de mais cuidadosas reflexões, insights importantes, que trabalharão pelo amadurecimento do Self, o viajante incansável da evolução...

O animal humano sexuado, vitimado pela pulsão dominante, não lhe é escravo exclusivo, porquanto outras pulsões apresentam-se-lhe com fortes imposições que não podem ser desconsideradas.

Desde a pulsão da fome àquelas do idealismo mais elevado, trabalham pela transformação das forças da libido em satisfações outras também plenificadoras que impulsionam para a saúde e o bem-estar

A pulsão do Filho Pródigo entregando-se ao sexo desvairado, na fase da deserção da casa paterna – o santuário do equilíbrio, o Éden da inocência - empurrou-o para o abismo do conflito e da culpa, do sofrimento e da amargura, descobrindo que o desejo sexual por mais acentuado, quase sempre ao ser atendido não oferece a compensação esperada, o que produz frustração e ansiedade.

A ansiedade leva ao desespero, e a perda do discernimento trabalha em favor dos transtornos de conduta que podem agravar.

Raramente, nessa situação, o ego desperta para perceber-se equivocado e induzir a volta para casa.

No conceito de que o ego é o centro da consciência, devem ser trabalhadas em todas as suas manifestações, a fim de valorizar os bens de que dispõe, não os desperdiçando com as meretrizes nem os companheiros de orgia, esses elfos que encontram-se como realidades arquetípicas no inconsciente, levando-os à repetição das experiências frustradas.

Existe um país longínquo a ser conquistado pelo ego, simbolizado pela conduta correta, pela consciência liberada dos conflitos.

A existência corporal é um mecanismo de distrações da consciência profunda do si-mesmo, que, embora superficial, tem grande importancia na escolha dos comportamentos humanos.

Caso alguém se coloque como o irmão mais velho da parábola, valerá o esforço de considerar que o outro, seu irmão, não foi feliz quando tentou ir para o país longínquo, mais teve a coragem de voltar a casa,  mesmo maltrapilho, esfaimado e arrependido.

A pulsão da fome é forte em todos os seres viventes, porque nela se encontram os recursos para a permanência, a continuidade da vida, o equilíbrio da saúde...

A sombra daquele que ficou aturde-o, torna-o irascível, em mecanismo de preservação da própria sobrevivência que situa nas posses que o pai lhe legou desde antes da morte, permanecendo, porém, morto psicologicamente para muitos valores mesmo durante a vilegiatura do progenitor.

Naquele momento, quando o irmão volta, a sua morte não lhe permite a clareza para compreender que também ele tem estado em um país longínquo, onde residem a indiferença, a ambição, a cupidez e o egoísmo.

As mudanças arquetípicas do ego ocorrem nas fases da infância para a juventude, daí para a idade adulta, e para a senectude, quando o Self, amadurecido, deve comandar o conjunto eletrônico delicado que é o ser humano.

Isso, porém, somente acontece quando os indivíduos estão dispostos a despertar para a realidade, superando a sombra ao invés de cultivá-la.

Não serão essas fases, cada período, também um país psicológico longínquo do outro, que deve ser conquistado a esforço e tenacidade da vontade?

A vontade é um impulso que nasce da razão e se transforma em força que deve ser direcionada de maneira adequada para resultados relevantes de dignidade e de crescimento intelecto moral no processo dos valores da existência terrestre.

Será, então, a vontade bem dirigida que impulsionará o ego para vencer cada fase, deixando-a à margem após transpô-la, a fim de que não venha a ressumar noutro período.

Por falta de esforço encontram-se indivíduos adultos vivendo o período arquetípico da infância, ou na idade avançada ainda com as aspirações de adulto, quando o organismo já não dispõe das forças naturais para esse tipo de comportamento.

Sendo o processo de vida um fenômeno entrópico, ele se desenvolve graças ao desgaste da energia, e por isso mesmo, cada período estará nutrido pelas forças hábeis e correspondentes à sua fase.

Mantendo-se o ego em harmonia com o Self, equilibra-se o eixo que os liga, e a sombra cede espaço ao discernimento, liberando toda a energia para o processo de individuação que deve ser a grande meta.

Há quem pense que a fuga do Filho Pródigo tem um significado arquetípico, no que se refere ao estoicismo, à coragem de buscar-se, de realizar o encontro, de descobrir-se interiormente, de conseguir a conquista do Self.

Concordamos, de certa forma, com a tese, embora lamentando apenas o processo da ingratidão, da perda do sentido existencial no abandono ao Pai, naturalmente rompendo o cordão umbilical, num momento em que ainda não dispunha da maturidade para os autoenfrentamentos, resultando na tentativa ou no retorno à casa de segurança, à proteção do genitor.

A conquista do si-mesmo deve ser feita em atitude interior para superar as sugestões da sombra egoísta e perversa, que seduz e ilude, dando imagens equivocadas da realidade e negando a possibilidade de libertação.

Na proposta de progressão junguiana, faz-se necessário o bom encaminhamento da energia da libido, canalizando-a para uma melhor compreensão da existência humana e da sua aplicação na conquista dos recursos que a edificam. Quando, por algum motivo, ela é interrompida, ocorre um choque, como, a perda dos interesses libertadores, passando a uma fase de regressão e perdendo-se no inconsciente, desenvolvendo complexos e conflitos perturbadores.

Nesse sentido, a psicoterapia em geral e a espírita em particular, libertando o indivíduo das amarras do erro e dos enganos, estimula-o à autosuperação das deficiências causado pelo empenho da vontade e contribuição da libido, agora direcionada para fins nobres, sem sofrimentos nem ansiedades de sublimação, mas apenas aplicando de maneira saudável.

Agindo dessa maneira, encontra-se o caminho de ida segura ou de volta razoável ao país longínquo, que pode estar no inconsciente como meta existencial a ser conquistada.

Texto trabalhado, do livro Em Busca da Verdade: Joanna de Ângelis psicografia de Divaldo Franco. Postado, dia 17/02/2014

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