segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014


UMA EXPERIENCIA PESSOAL

Depois de várias noites com um sono inquietante, um sonho revela afinal o que estava por acontecer: uma piscina com agua clara exercia uma atração imensa como a luz atrai a mariposa; era necessário mergulhar, mergulhei... Uma voz que vinha lá do fundo chamava, e quanto mais fundo eu ia, mais escura ficava a água. Era uma sensação de morte, e pensava: vou morrer, é isso, vou morrer. Chegando ao fundo, lá estava ele, o irmão de Zeus – Netuno – com o seu tridente. Ele dizia: é preciso ficar aqui por um tempo, acordei.

Esse foi o primeiro contato com a depressão, que durou alguns meses, que representaram uma mudança grandiosa de vida.

A depressão foi uma possibilidade positiva de crescimento, e a partir dessa experiência foi possível começar uma jornada enriquecedora, grandiosa e cada vez mais consciente.

Existe algo que conspira a favor da depressão, pois a “pressão para baixo”, que leva ao mergulho, transcende o ego de tal maneira que mesmo que ocorra resistência não é possível sair dessa experiência sem uma modificação positiva.

Na verdade existe um grande medo de seguir em direção ao Hades, pois afinal o que se pode ganhar? Mas, como o psiquismo é dinâmico, o movimento da energia psíquica irá levar para lá, queira-se ou não. Então é melhor prestar bastante atenção no caminho, pois serão muitas as visitas durante a jornada.

Hoje, depois de tantos anos da experiência pessoal, e com um olhar terapêutico, consigo ver a depressão como uma tristeza que se transforma em patologia. Ela realmente desorganiza emocionalmente, bagunça o eu, desestabiliza a ordem, como fez Prometeu, e leva ao tártaro. Reconhecer as próprias feridas é a tarefa crucial na depressão.

Encarar a sombra, a dor e o sofrimento garante a maturidade necessária para transformar a personalidade, reconhecer o bem e o mal e reconciliar os opostos. Não adianta protestar o direito à felicidade: é necessário buscar o significado.

A depressão é um convite, um desafio da vida para que encontremos o real sentido, o que nos move por dentro. É a luta do herói contra o dragão, e nessa luta saímos da ilusão inocente de felicidade e conquistamos a certeza de que a vida só é verdadeiramente vida se tiver significado.

Por esse ângulo o sofrimento causado pela depressão possibilita uma expansão de consciência, uma perspectiva muito mais ampla do que o ego pode perceber. “Somos o abismo e também a corda que o atravessa” como dizia Nietzsche, citado por HOLLIS, no livro Os Pantanais da Alma , pg.198, e perceber isso é também compreender a responsabilidade que nos é colocada, somos livres para transformar a nossa vida além das experiências do passado. Podemos ir muito além, e só precisamos dar um passo em direção ao Hades, não para lá ficar, mas para resgatar importantes partes da nossa personalidade que lá permanecem.

Olhar a depressão por uma perspectiva analítica e espírita é possibilitar ao depressivo a “cura da alma”, é ajuda-lo a compreender que não se compra em farmácias a solução do seu sofrimento e da sua angustia, e sim, que esse é um momento de experienciar a vida.

O ganho? O encontro com o significado.

Texto de Iris Sinoti, no livro Refletindo A Alma. Postado dia 17/02/2014.

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