segunda-feira, 25 de agosto de 2014


 
 
 
 
A VIDA E A GRATIDÃO
 
Jung disse que a finalidade da vida não é a conquista da felicidade, mas a busca de sentido, de significado.
A felicidade, conforme se pensa, é a alegria, o júbilo por determinadas conquistas, é a vitória de algum empreendimento, ou a viagem ao país dos sorrisos.  Essas emoções que surgem no prazer e no bem-estar estão próximas da felicidade, que traz mais complexidades psicológicas do que se imagina.
No conceito junguiano, o sentido existencial, o seu significado transpessoal, é mais importante do que as sensações resultantes do ter e do prazer, e transformam-se as vezes em emoções que duram algum tempo.  Analisando-se o fenômeno, percebe-se  que tudo que traz prazer tem pouca duração, transforma-se, dá lugar a outros nem sempre felizes... A alegria de um dia transforma-se, muitas vezes, em preocupação, em desgosto.  Essa felicidade risonha de um encontro, de uma explosão de afetividade ou de interesse atendido, quase sempre transforma-se em véspera de dor de contrariedade, de arrependimento e de mágoa...
O sentido, o significado existencial caracteriza-se pela busca interna, pela transformação moral e intelectual do individuo ante a vida, pelo aproveitamento do tempo na identificação do self com o ego.  É um sentido profundo, no começo de autorrealização, depois de autoiluminação, de autoencontro.
É preciso estar atento para perceber melhor as sensações que produzem empatia e as emoções que trazem harmonia.  O ego prefere o mergulho nas sensações do poder, do gozar, do tocar e sentir, enquanto o self busca vivenciar e ser, ampliando os seus horizontes de gratidão.
Quando se busca o sentido, a pessoa não se detém para avaliar o resultado das conquistas imediatas, porque não cessa o significado das experiências vivenciadas e por experienciar.  Trabalha o ser interno, inundando-se do conhecimento e de vivência, vestindo-se de beleza e de saúde.  Mesmo que surja algum distúrbio orgânico, não impede a continuação da sua necessidade de sentido, por compreender que é natural próprio do processo em que se encontra, avançando em equilíbrio íntimo.
Esse significado estende-se a todas as formas de vida, às varias manifestações existenciais, dirigindo-se ao cosmo... 
Conta-se que há muito tempo um circo famoso, que se apresentava em Londres, tinha um elefante gentil, motivo da alegria das crianças, dos adultos, dos idosos, de todos que iam ao espetáculo em que ele era a atração.  Seu nome era Bozo, ele era muito dócil.  Bailava com o corpanzil, movia-se com suavidade, deitava-se e levantava-se com leveza...
Em determinado momento, para surpresa de todos, o paquiderme tentou atacar e matar o seu tratador, causando grande desgosto.  Porque agora urrasse colérico, ameaçando todos que se aproximavam da  jaula, transformou-se em perigo público, e as autoridades solicitaram ao proprietário do circo que o eliminasse.
Para não perder totalmente o dinheiro que Bozo representava, o seu dono resolveu utilizá-lo para um último espetáculo, quando ele deveria morrer publicamente, e, para isso, anunciou e vendeu ingressos para o trágico acontecimento.
No sábado marcado, pela manhã, antecipadamente anunciado, o circo estava repleto de curiosos e de insensíveis que ali estavam para ver a morte do animal que antes os distraía, numa demonstração cruel e selvagem de indiferença.
Na jaula circular, o animal movimentava-se agressivo, emitindo sons estranhos e arrepiantes.
Do lado de fora, os homens uniformizados, que se equipavam para o final terrível.
No momento, em que o proprietário anunciava o fatídico acontecimento que logo teria lugar, alguém dele se aproximou, tocou-lhe o ombro e disse quase com doçura:
- Não lhe seria mais útil se o senhor pudesse manter vivo o animal?
E o empresário respondeu, quase com rispidez:
- Não tenho como poupá-lo, ele enlouqueceu e pode matar alguém.
- Permita-me, então, entrar na jaula e acalmá-lo, num breve tempo em que lhe possa falar.
Estremunhado, o dono do circo olhou para aquele homem de pequena estatura e respondeu:
- Se eu permitisse uma loucura dessas, o elefante o faria picadinho, matando-o de forma impiedosa.
- Eu correrei o risco – afirmou o estranho – E para poupá-lo de problemas ou contrariedades, eu assinei este documento que lhe entrego, assumindo toda a responsabilidade por meu ato.
O empresário olhou o papel de relance, anunciou a proposta ao público, e a massa, buscando sensações fortes, tal qual um circo romano do passado, aplaudiu a anuência.
A porta de ferro abriu e o homem entrou na jaula.  O animal pareceu ficar mais irritado, parando o movimento circular, enquanto o visitante dizia baixinho, o que ninguém entendia, num tom melódico, lembrando uma canção mântrica.  Ouvindo-o, o animal foi-se acalmando, deixou de balançar-se, os olhos injetados recuperaram a expressão habitual, o estranho aproximou-se mais, tocou na tromba e delicadamente puxou o paquiderme, fazendo um círculo em torno da jaula, com a sua maneira característica muito conhecida.
O público, surpreso, aplaudiu o ato.
O visitante da jaula saiu calmamente como havia entrado, tomou o chapéu-coco e o paletó, vestiu e saiu, sem valorizar a mão estendida do agora feliz proprietário de Bozo.
Olhando para trás, disse:
- Bozo não é mau.  Ele estava apenas com saudades do hindustani, o idioma no qual foi amestrado após nascer.  Tratando-se de um elefante hindu, ele estava com saudade da sua terra, da língua materna, e acalmou-se, recuperando sua paz.
E não apertou a mão do diretor do circo.
Surpreso, o ambicioso proprietário olhou com mais cuidado o documento que tinha na mão e espantou-se, por estar assinado por Rudyard Kipling, o inesquecível amigo dos animais, que escreveu tantas histórias sobre eles que foram traduzidas em muitos idiomas.
A gratidão de Kipling ao animal saudoso devolveu-lhe a vida, enquanto Bozo, ouvindo a música doce do idioma a que estava habituado, expressou a sua gratidão, recuperando a calma.
Gratidão também é uma forma de sentido existencial, de significado da vida, que poucas pessoas sabem aplicar no seu desenvolvimento emocional.
Do livro, Psicologia da Gratidão, escrito por Divaldo Franco, pelo Espírito Joanna de Ângelis. Postado, dia 25/08/2014.
 
 

 

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