sábado, 20 de setembro de 2014


 

O milagre da gratidão

Os sentimentos inferiores, herança do processo evolutivo vivido no período do  instinto dominador, são prisões sem grades que limitam o movimento emocional e espiritual do ser, constrangendo o processo iluminativo e gerando sofrimentos.

São responsáveis pelo ressentimento, pela raiva, pelo ciúmes que se transformam em conflitos graves no comportamento humano. Esse ego primitivo têm obrigação consciente de eleger o bem-estar e a saúde como diretrizes que lhe traga a harmonia, possibilitando a identificação com as aspirações do self em estágio superior de apercebimento da finalidade existencial.

Ficando como sombra morbosa, abre espaço à instalação de emoções também primárias, que a razão bem dirigida deve superar.

Emergindo frequentemente do inconsciente pessoal, afastam o paciente do convívio social saudável, fazendo que os seus relacionamentos domésticos sejam desagradáveis, de agressividade ou de indiferença, de distanciamento ou de introspecção rancorosa.

Graças a conquista da consciência, o ser humano, está destinado à individuação que alcançará pela perfeita fusão do eixo ego-self, à completude, na qual retornará à unidade que sofreu fissão durante o processo antropossociopsicológico da evolução através das reencarnações.

Jung afirmou que, a individuação é o “processo de diferenciação que busca o desenvolvimento da personalidade individual e da consciência do ser único, indivisível e distinto da coletividade,” quando o self atinge a culminância da sua realidade imortal ...

Deve ser colocado a serviço do equilíbrio, da harmonia emocional e psíquica, todo esforço para combater as imperfeições morais

Nessa abordagem clinica, a gratidão tem função psicoterapêutica muito importante por entender os acontecimentos do dia a dia, mesmo os perturbadores, não interferindo no comportamento equilibrado, que resulta da consciência de responsabilidade ante a vida. O amadurecimento psicológico desperta a consciência para a sua realidade transcendental, superando os impositivos imediatos dos instintos e ampliando as percepções dos valores existenciais.

Não se pode evitar as aflições no transito humano, tendo-se em vista os atavismos pessoais, a convivência social e familiar  desafiadora, propiciando aprimoramento dos sentimentos, particularmente a tolerância, a compaixão, o interesse afetivo, a solidariedade...

Normalmente acredita-se que a gratidão é um sentimento sublime que opera os milagres do amor, diante do seu caráter retributivo. Porém esse conceito, limita-o ao  reconhecimento pelo bem que se recebe e pelo desejo de devolvê-lo. Na análise de Joanna de Ângelis, muito sutil e mais profunda, vai além da compensação pelo que se recebe e se vivencia.

Quando alguém consegue a experiência da gratulação, mesmo em relação aos insucessos, que podem ser considerados  experiências que ensinam a agir com responsabilidade e retidão, alcança o patamar em que deve ser vivida.

O sentido psicológico da reencarnação é conseguir-se a transformação moral do self e a liberação dos seus conteúdos ocultos ou que se encontram em germe, capacitando-o aos enfrentamentos com outros arquétipos inquietadores, especialmente quando se tornam imperiosos e dominantes no comportamento. Uma conscientização do ser que se é possibilita renovação das forças morais para diluir a sombra e desenvolver as experiências renovadoras.

A arte da gratidão que é a ciência da afetuosa emoção pelo existir leva a condutas que parece paradoxal, como no caso das aflições e dos desaires...

Há um século e meio quase. Santo Agostinho, Espírito, conclamava os que sofriam à coragem e à resignação, ante as aflições, mesmo as de aparência cruel, propondo: “as provas rudes ouvi-me bem, são quase sempre indício de um fim de sofrimento e de um aperfeiçoamento do Espírito, quando aceitas com o pensamento em Deus.”

 As provações, bênçãos que a vida oferece ao calceta, que cometeu no passado e/ou na atual existência arbitrariedades, ferindo a harmonia das leis universais, comprometendo a consciência,  para que disponha de meios de recuperar-se da culpa inscrita na intimidade do ser, vivenciando a contribuição do sofrimento que o dignifica, já que a relatividade orgânica está sempre sujeita a essa sinuosidade com altibaixos na saúde e no bem-estar...

O processo da evolução, é como uma correnteza que enfrenta obstáculos por onde corre até alcançar o seu destino, um lago, um mar, um oceano...

Não cessando de prosseguir, quando enfrenta dificuldades, acumula as águas com tranquilidade até ultrapassá-los, pois a sua meta está à frente, aguardando-a.

Assim também, as experiências evolutivas do ser humano ocorrem em programação marcada por variadas e sucessivas etapas até alcançar o estado numinoso.

A gratidão pelos insucessos aparentes é o reconhecimento por entender como parte da aprendizagem e a sua ocorrência como dores, sofrimentos morais consequentes à traição, à calúnia, ao abandono de antigos afetos, tem razão de ser. Melhor sofrê-los, vivenciá-los com resignação quando se apresentam, do que ignorá-los, envolvê-los em máscaras ou postergá-los...

Num olhar superficial, acredita-se que seja uma patologia pelo sofrimento em transtorno masoquista. Na realidade, tal conduta traduz maturidade saudável, por não ser uma escolha do sofrimento, mas uma aceitação consciente e natural do fenômeno-dor, como parte do curso evolutivo.

Gratidão, em qualquer situação, boa ou má, como dizia o apóstolo Paulo, que era sempre o mesmo na alegria, no bem-estar, no sofrimento, no testemunho, mantendo a integridade do self, em razão da consciência do dever nobremente cumprido, considerando as dificuldades e os sofrimentos fenômenos naturais no seu processo de integração com o Cristo.

Quando se conquista o hábito de agradecer, os morbos emocionais da ira que se converte em ódio, da mágoa que se torna desejo de vingança, da inveja que quer a destruição do outro, não encontram áreas na psique para tornarem-se sofrimentos... A alegria de ser-se grato permite entender-se a pequenez do ofensor, a jactância e fatuidade do perverso, a fragilidade do adversário... Uma emoção de tranquilidade preenche todos os espaços íntimos do self, onde se desenvolveriam os sentimentos inferiores.

Da mesma forma, quando se recebe a notícia de uma doença irreversível, de um acontecimento grave e mutilador, a gratidão possibilita viver-se plenamente cada momento, ante a convicção racional da sobrevivência ao corpo somático,  credor de toda a gratidão por conduzir-se como um doce jumentinho do self, conforme o denominou o irmão alegria de Assis, o numinoso sempre grato a Deus por tudo, inclusive pelo momento em que se aproximou a irmã morte.
Livro: Psicologia da Gratidão, psicografia Divaldo Pereira Franco, pelo Espirito Joanna de Ângelis

Postado dia 20/09/2014.

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