sábado, 2 de março de 2019


A GRATIDÃO COMO ROTEIRO DE VIDA


Passando por níveis diferentes de discernimento e de lucidez, a conquista da consciência é o grande desafio da vida. Pode-se mesmo transformar essa conquista no sentido, no significado que Jung propõe se dever buscar,  substituindo mesmo a ilusão da felicidade, fugidia, que a realidade dilui logo depois de ser  alcançada. ...

Causado pelos diferentes estágios de consciência fisiológica (comer, dormir, reproduzir-se,) ou psicológica (comer, dormir, reproduzir mas também pensar e agir com discernimento e segurança ético-moral), o sentimento de gratidão apresenta-se também na capacidade de compreender e de sentir o valor da existência terrena.
                                                      
Algumas culturas modernas conservam ainda o conceito marxista e primário de que a gratidão é um sentimento feminino, emoção específica da mulher, não devendo ser cultivada pelo homem.

Com esse entendimento, quando um homem expressa gratidão, dizem, que se encontra em conflito de sexualidade predominando aí a anima no comportamento.

Nessa teoria ultrapassada o homem, deve caracterizar-se pela força, entendida como brutalidade, vigor de sentimentos e quase total ausência das emoções superiores da ternura, da bondade, da abnegação, sendo o sacrifício mais um gesto estoico e másculo do que a entrega ao ideal, ao sentido de viver.

Como consequência, essa manifestação natural  da emotividade cheia de amor é recalcada e desprezada, dando origem a culpa inconsciente pela instalação da ingratidão, que é o seu oposto.

Numa linguagem poética, a flor e o fruto, o lenho e a sombra são a gratidão  da planta a benção da vida.

A pureza generosa e refrescante é a gratidão da nascente reconhecida por existir.

O grão que se deixa triturar é a gratidão  presente nele para se transformar em pão e  dessa forma em manutenção da vida.

Porque pensa e sente, o humano é constituído pelas emoções que, na fase primária, são agressivo-defensivos e, à medida que evoluir, transformam-se em reconhecimento e retribuição. Não seria como uma devolução equivalente ao que recebeu, como um pagamento pelo que lhe foi dado, mas  como alegria, reconforto, pelo que conseguiu.

Todo crescimento pessoal cultural, moral e espiritual dirige-se para o sentimento de gratidão, da oferta, da participação no conjunto, tornando-se o indivíduo também útil e importante.

A gratidão individual é uma nota harmônica contribuindo na sinfonia universal, ampliando-se e tornando-se um sentimento coletivo que proporciona o equilíbrio social e espiritual da humanidade.

É correto pensar-se que gratidão seja  instrumento de afeição, mas o seu significado vai além ele deve transformar-se numa forma de viver-se, de entregar-se ao processo de crescimento interior, de realização do progresso.

Desejar-se a gratidão como flor espontânea que medra em determinados momentos e logo emurchece, não é o suficiente.

Ela deve ser treinada, exercida como forma de comportamento, externando-se em todas as situações em forma de alegria e de satisfação.

Normalmente, os portadores de transtornos de conduta, os psicóticos e aqueles que sofrem de psicopatologias tornam-se ingratos, perdem o contato com a realidade dos sentimentos e  voltam ao primarismo egoísta e soberbo das atitudes negativas. É claro que esse tipo de enfermidades, resultantes de problemas na área das neurocomunicações, apresentam carência de serotonina, de noradrenalina, de dopamina, amortecendo-lhe as emoções superiores e castrando as comunicações da afetividade. Mas esse tipo de ocorrência, encontra-se atrelada ao estágio evolutivo do paciente, às suas construções mentais quando esteve saudável, aos mecanismos de ansiedade e de desconfiança, de fácil irritabilidade e enfado.

O exercício, da afeição que se gratula e se expressa gentil, enriquece a emotividade superior, empobrecendo o egoísmo e desenvolvendo o self que se libera de algumas das imposições do ego, facilitando a comunicação no eixo entre ambos...

Não é sempre, que, o indivíduo sente a gratidão, por vários motivos: infância infeliz, família turbulenta e difícil, relacionamentos malsucedidos, solidão, complexo de inferioridade ou de superioridade que embrutecem os sentimentos, desenvolvendo  ferramentas de autodefesa.

Isso não deve preocupar. Constatar que não se sente gratidão já é uma forma de compreendê-la, de percebê-la na sua manifestação inicial. À medida porém que as emoções se expandem e o inter-relacionamento pessoal permite a ampliação do convívio com outras pessoas, aparecem os pródromos do bem viver, da comunhão fraternal, do desinteresse imediatista contrárias às condutas doentias, e vai surgindo espontaneamente o reconhecimento de amor e de ternura à vida e a tudo quanto existe.
                                                         
Não havendo ninguém autossuficiente, que seja desvinculado de outrem, que não necessite da contribuição de outras pessoas individualmente e da sociedade em geral, é inevitável que a busca de companhia, o descobrimento de valores que existem nas outras pessoas, a grandeza moral de que muitos dão excelentes mostras  despertem o sentimento de gratidão como retribuição mínima ao contexto social no qual se vive.

A psicoterapia da gratidão, preventiva aos males e curadora de conflitos, está presente em todas as obras relevantes da humanidade, tanto nas de natureza filosófica ou religiosa, seja nos comportamentos dos grandes construtores da sociedade, mártires ou santos, pensadores ou místicos, legisladores ou profetas... Porque ninguém consegue vincular-se a um ideal de engrandecimento humanitário sem arrastar outros pela emoção do seu exemplo e da sua bondade para as fileiras da sua trajetória.

O sentimento da gratidão é de natureza psicológica e imediatamente aciona o gatilho, se transformando em emoção e sensação orgânica.

Quando se experimenta o sabor da gratidão, aumenta-se o desejo de servir mais e melhor contribuir no grupo social em que cada qual se encontra e na humanidade em geral.

Inevitável é, portanto, a presença da gratidão no cerne das vidas humanas.
  
Texto de Joanna de Ângelis, psicografado por Divaldo Pereira Franco no livro, Psicologia da gratidão. Trabalhado e editado por Adáuria Azevedo Farias. 02/03/2019.

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