sábado, 27 de abril de 2019


GRAVITANDO EM TORNO DE DEUS
A GRATIDÃO E A PLENITUDE

A busca da plenitude é natural, por ser a superação do sofrimento, da angustia, da ansiedade e da culpa, significando o encontro com a consciência ilibada ou pura portanto  que sabe conduzir o carro orgânico ao destino da iluminação. Embora, ninguém possa se libertar totalmente dos atavismos, das heranças, sem a aquisição de novos hábitos, especialmente das heranças mitológicas que o vinculam à condição de humanidade, portanto ficando sempre sujeito a aflições e a todas as  sujeições do veículo carnal.

Plenitude sem inquietações é  utopia, a partir mesmo da impermanência do corpo físico. Compreendendo-se o seu desgaste, a sua degeneração que lhe é própria, as alterações e mudanças de constituição, produzindo mal-estar, dores, ansiedade, melancolia, inquietação.

A plenitude é o estado de harmonia entre as manifestações psíquicas, emocionais e orgânicas resultante do perfeito entrosamento da mente, do self - que também possui alguma forma de sombra,- com o ego, integrando-se sem luta, a fim de readquirir a unidade.

Essa conquista numinosa, transcendente que resulta da autoconsciência, liberta o sentimento de gratidão que faz parte da individuação, produzindo uma aura de inigualável luz em volta de si.

Alcançar esse estado psicológico de auto-integração traz a noção de uma expansão da consciência na direção da Divindade, de onde vem e para onde volta sempre que encerra uma das muitas etapas de aprendizagem terrena.

É natural, que a caminhada humana se caracterize pelos experimentos psíquicos do desenvolvimento do deus interno, e da libertação das síndromes que se transformam em bengalas psicológicas para justificar o não crescimento interior, a continuação da queixa, do azedume, da paralisia emocional, em que se satisfaz em situação de masoquismo.

O Espirito é destinado à plenitude desde que foi criado por Deus simples e ignorante.
Simples, porque sem complexidades resultantes do conhecimento, da lógica, da evolução. Ignorante, pelo predomínio da sombra no self  e falta dos recursos intelecto-morais que o engrandecem como efeito do esforço pessoal na conquista dos valores que estão ao seu alcance.

Os conflitos são constantes, caracterizados por momentos de coragem e de desencanto, por desejo de crescimento e medo das conquistas libertadoras, por dúvidas e melancolia...

A sombra acompanha o ser humano enquanto estiver no processo de autoiluminação, abrindo espaço para a harmonia quando da sua libertação da matéria.

O historiador grego Heródoto de Halicarnasso, diz que Sólon, o nobre filósofo, dialogando com o rei Creso, da Lídia, considerado o homem mais rico do mundo no seu tempo, que se considerando feliz pelos tesouros adquiridos, após apresenta-los ao sábio, perguntou, na sua opinião qual seria o homem mais feliz do planeta. E porque o gênio ateniense dissesse que conhecera um jovem chamado Téluz, que ficou famoso em Atenas pela sua nobreza de caráter e pela abnegação, a quem assim o considerava, o monarca soberbo trouxe nova pergunta:

- E, na sua opinião, qual é o segundo homem mais feliz do mundo? – crendo que seria citado como exemplo, novamente constrangeu-se com a resposta do convidado, que disse haver conhecido dois irmãos que cuidavam da mãe e, quando ela desencarnou, dedicaram a vida a servir à cidade-Estado. Creso não pôde mais esconder o desencanto e tornou-se indelicado com o convidado, realmente mais sábio daquela época.

Sólon continuou tranquilo e, no momento da despedida, disse?

- Rei, ninguém pode afirmar-vos se sois feliz, senão depois da vossa morte, porque são muitos os incidentes e ocorrências que modificam os transitórios estados emocionais e econômicos de todas as criaturas...

De fato, mais tarde, após a morte do filho Actis, em circunstâncias trágicas, e a destruição do seu país que sucumbiu às tropas de Ciro, o Grande, da Pérsia, vendo Sardes, a capital da Lídia, ardendo, e todos os tesouros nas mãos dos invasores, ele concordou com Sólon, e proclamou no poste em que seria queimado vivo:

- Oh! Sólon! Oh! Sólon, como tinhas razão!
Ouvido por Ciro, o conquistador, que também amava Sólon, o filósofo, perguntou a razão pela qual se referia ao nobre sábio, e, após narrar a experiência, teve a vida poupada, tornando-se seu auxiliar no controle dos bens e educador de Cambises, seu filho...

A transitoriedade dos valores materiais, inclusive da argamassa celular, torna o Espírito reencarnado vulnerável às injunções normais da existência física.

Creso, pioneiro da fundação de moedas de ouro, tendo imensa fortuna em ouro trazida pelas águas do rio Pactolo, que dividia a capital da Lídia, não lembrou de ser grato à vida, pensando somente em acumular, embora vitimado pelas circunstancias, em que foi pai de um surdo-mudo e o seu herdeiro teve uma desencarnação trágica ao ser varado pela lança atirada pelo seu amigo Adasto, filho do rei Midas, da Frígia...

O que se tem é apenas enfeite, adorno, é preciso que se considere psicologicamente o que se faz, o que se é, e tudo o que se trabalha interiormente e transformar em gratidão pela vida, pela oportunidade de autoiluminação.

Apesar da riqueza, Creso não era realmente feliz, pois não pôde evitar o nascimento do filho limitado, nem a morte do herdeiro amado, nem, a invasão e destruição do seu reino. Mas, quando se permitiu a humildade de reconhecer que Sólon tinha razão, pôde ter a sua e a vida dos familiares poupadas da morte perversa que espera sempre os vencidos.

Ciro, quando libertou o rei e família vencidos disse:
- Quero que anote a minha generosidade, pois, se algum dia eu vier a cair vitimado em alguma batalha, espero que se use da mesma misericórdia para comigo, conforme o uso para com ele (Creso).
São os valores morais, as conquistas espirituais,  responsáveis pela gratidão que resulta de todas as oportunidades de crescimento e de valorização da vida, enriquecendo o ser humano de generosidade, filha da sabedoria de viver.

Aquele que é grato, que reconhece a sua pequenez ante a grandeza da vida, torna-se pleno e feliz.   

Divaldo Pereira Franco no livro, Psicologia da gratidão. Trabalhado e editado por Adáuria Azevedo Farias. 27/04/2019

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